Páginas

domingo, março 26, 2006

A Imprensa, verdade e “liberdade de expressão”

O Gustavo Nagel, em seu Blog, o “lado ‘b’ de minha mente” (nome bem criativo, por sinal) trata de uma questão interessante: “Liberdade de Expressão”: isso significaria liberdade para propagação de qualquer coisa? Dois exemplos são trazidos – a reação contra as charges dinamarquesas sobre o islamismo (deveriam elas ter sido publicadas?) e a tentativa de grupos judaicos de proibir a reimpressão de um livro supostamente histórico que revelaria os segredos de uma malévola conspiração judaica (estão certos em procurar impedir a nova edição?).

Os desenhos dinamarqueses, todos já conhecem e sabem das repercussões internacionais causadas por eles; o livro mencionado, “Protocolo dos Sábios de Sião”, conheci há uns 30 anos, nos Estados Unidos. Obra possivelmente espúria e pseudo-histórica, ela tem circulado em vários países. Na época em que a conheci, servia de combustível, sim, para fomentar o antisemitismo e o ódio aos judeus e assim têm sido os motivos por trás de sua distribuição ao longo dos anos.

No entanto, antes de entrarmos no debate se tudo deve ou não ser publicado, ou se as charges anti-maomé deveriam ter sido censuradas pelo editor, ou vistas apenas como expressão cômica-mordaz de verdades nem sempre expressas, cabem algumas considerações de cunho pessoal sobre a nossa interação com a mídia, sobre o apreço pela verdade e, posteriormente, sobre nossa compreensão do que é “censura”.

A verdade é um fator essencial na comunicação e em nossa avaliação dos Meios de Comunicação. Isso é válido não apenas na transmissão do Evangelho, mas também como ponto de aferição da chamada “imprensa secular”. O nono mandamento (não dirás falso testemunho) estabelece a importância da verdade na comunicação. Um grande comunicador de massa disse que da mesma forma que uma munição só é poderosa se explodir, as idéias só são eficazes se forem comunicadas. A isso poderíamos adicionar que a comunicação só encontra o seu propósito justo e certo se for fundamentada na verdade. Cabe ao Cristão procurar discernir sempre a verdade e não deixar se empolgar com as primeiras notícias e aparências.

Devemos exercitar a mesma cautela que rege os princípios bíblicos de apresentação de testemunhas para substanciar uma história (Deuteronômio 19.15 estabelece que duas ou três testemunhas deveriam sempre ser ouvidas). Isso significa que devemos ter uma mente inquisitiva e fazer perguntas como essas:

  • Quais foram as fontes para essa notícia?
  • Existiria algum motivo de difamação ou sensacionalismo, por trás disso?
  • Existe prova suficiente para essas afirmações?
  • Qual a posição e convicção religiosa, moral ou política dos autores desse artigo?
  • É possível separar os fatos, da filosofia anti-cristã, que possivelmente essa notícia contém?

Não podemos deixar de lembrar um incidente ocorrido na cidade de São Paulo, no ano de 1994, quando uma família proprietária de uma escolinha para crianças foi acusada de abusar sexualmente de seus alunos. Como o assunto, em si, traz um potencial de revolta e (justa) indignação muito grande, observou-se um imediato julgamento da questão, não nos tribunais, mas nas páginas da mídia, que culminou na prisão do casal apontado, bem assim como na depredação da escola. Naquela ocasião, parecia importar muito mais a venda dos jornais, pelo sensacionalismo, do que a transmissão e a investigação da verdade. Até as autoridades policiais, que inicialmente lidavam com a questão, se deixaram envolver no clima, aparentando procurar uma autopromoção. Rigoroso inquérito que se seguiu, com a substituição do primeiro delegado, revelou a inexistência de fundamento para quaisquer das acusações levantadas. Vidas, entretanto, foram desgraçadas e nomes jogados na lama, pela falta de seguimento das mais elementares diretrizes bíblicas, de apreço à verdade.

Reconhecemos, entretanto, que Deus em sua misericórdia, tem muitas vezes usado os meios de comunicação para colocar em evidência desmandos administrativos e governamentais, provocando uma vigilância maior desses incidentes pela sociedade como um todo, trazendo à tona verdades encobertas (Pv 16.16).

Mas a comunicação pode ser mal utilizada. Este fato é evidente desde o incidente da Torre de Babel. A linguagem falada é o meio primário de comunicação, mas até este foi abusado pela natureza pecaminosa humana. É errado acharmos que os meios de comunicação são veículos neutros, quando se encontram sobre o direcionamento e administração de homens (2 Jo 1.1-11). Se em Babel houve o abuso, quanto mais na utilização das técnicas mais sofisticadas modernas. Não podemos ser ingênuos e achar que existe a objetividade propalada pelos comunicadores. Temos a tendência em achar que se foi divulgado, é verdade objetiva, mas precisamos fazer como os Bereanos fizeram e estar sempre confrontando o que vemos e ouvimos com padrões que expressem e sirvam de referencial à veracidade do que está sendo comunicado (At 17.11).

Em um próximo post, tratarei da questão da censura – é válida, ou ela é incompatível com uma sociedade democrática?

9 comentários:

  1. Olá, Presb. Solano, depois de um tempo enooorme de ausência estou aqui novamente, pronto para a batalha (provavelmente amanhã teremos novo post no Post Tenebras Lux).
    O post é bastante relevante para os dias atuais e acaba atingindo em um ponto que acho importante.

    Qual o resultado de uma existência de liberdade "total" de expressão adicionada à uma corrupção geral do gênero humano?
    Lógicamente, nós, seres humanos caídos, somos tentados a cada instante a usar a nossa "liberdade" para obter proveitos pessoais e não justiça.
    Acho que censura não é algo eficaz (até porque pode facilmente ser manipulada), mas acredito sim, que todos aqueles que fazem uso da tal liberdade também arquem com as consequências (justas, é claro) de seus atos.

    Abraços,

    Davi Eduvirges

    ResponderExcluir
  2. Solano,

    Eu iria até um pouco mais para o início da História, antes de Babel. Citaria o slogan da imprensa infernal: "é assim que Deus disse?"

    ResponderExcluir
  3. Davi - O ponto é bem levantado por você. Partindo da premissa da corrução total do gênero humano (e, se extraimos nossas premissas da Bília, teríamos de concordar com isso), o que acontece com uma "liberade" na qual não se colocam limites à violação da "liberdade" alheia, ou de princípios absolutos dados à raça humana para o bom conviver em sociedade?

    Mas, como eu disse, em próximo post abordo a questão da censura...

    Solano

    ResponderExcluir
  4. Charles:

    "Imprensa infernal", essa é ótima! Realmente é interessante que essa primeira intercomunicação começa distorcendo uma assertiva que afirmava exatamente o contrário.

    Abs

    Solano

    ResponderExcluir
  5. Excelente análise irmão Solano, já faz um tempo que linkei o blog!

    PS. Só uma pergunta (ou melhor, duas).. seria a serpente a primeira hermeuta? e a mulher a primeira versão na linguagem atualizada da bíblia? :-)

    abraços
    Lindemberg

    ResponderExcluir
  6. Caro Lindoberg:

    Obrigado pelo estímulo. Não é curioso que a serpente, a primeira hermeneuta, sem dúvida, produz interpretação inadequada? Isso mostra que o desprezo às regras de hermenêutica é satânico...

    A versão da mulher era a King James, mesmo. É que ela estava citando algum apócrifo (presentes nas primeiras versões da KJV)...
    ;>)

    Solano

    ResponderExcluir
  7. Solano,

    É uma verdade que esta discussão sobre a liberdade de expressão se dá ao mesmo tempo da discussão sobre censura. É um fato já conhecido que toda vez que é feita alguma restrição a qualquer tipo de conteúdo, associam logo à ditadura militar. O que não me parece o caso.

    De qualquer forma, se pensarmos que deve haver o mínimo de controle nas informações que circulam por aí, visto que nosso padrão é a verdade, aqueles que se negam a ver em Deus e em sua Palavra a verdade, logo perguntarão: "que verdade?" ou "qual verdade?"

    O critério, enfim, ficaria nas mãos de quem? Do Estado? Da igreja? Ou recairía sobre critérios totalmente subjetivos: "minha verdade" e "sua verdade"?

    É uma questão bem complexa que, penso eu, deve ocupar, de alguma forma, a atenção da Igreja. Aguardo a opinião do senhor sobre a censura.

    Abraços.

    ResponderExcluir
  8. Caro Nagel:

    A realidade é que a verdade é algo muito menos subjetivo do que nos querem fazer acreditar.

    Dê uma olhada na reportagem que a VEJA tem neste último final de semana (26.03.06) na qual ela aborda 40 questões éticas, dando respostas de algibeira sobre o que é certo ou errado fazer. Avaliando do ponto de vista da ética cristã, eles acertam em 95% dos casos - colocando como ERRADO aquilo que é REALMENTE ERRADO. Nada da subjetividade tão queridinha da era pós-moderna.

    A Palavra de Deus nos indica que os que não conhecem a Deus de forma pessoal (chamados por Paulo de "gentios" - Rm 2.14-16, e de "incircuncisos por natureza" - Rm 2.27) tem os preceitos da lei moral de Deus "gravados em seu coração" - aquilo a que chamamos de consciência.

    Temos, portanto, muito mais campo comum do que querem que nós acreditemos de apelar à "verdade verdadeira" e não devemos nos render a esse papo intelectualóide insano de que "existem várias verdades, contraditórias entre si que são igualmente válidas"; ou "qual a verdade? A minha, ou a sua?".

    As pessoas (e muitos cristãos) confundem a IMPOSSIBILIDADE de se chegar à verdade de forma exaustiva (esgotando tudo o que se pode conhecer - situação possível somente a Deus, em sua finitude e ausente em nós, em nossa finitude) com IMPOSSIBILIDADE de se chegar à verdade absoluta. A segunda proposição é falsa, pois podemos, sim, ter certeza de várias coisas - mesmo conhecendo parte e não o todo do que conhecemos. Mas, infelizmente, temos toda uma geração de verdadeiros "agnósticos cristãos", amorfos, sem convicções.

    Você aponta, corretamente, a dificuldade do diálogo, pois as bases de aferição são díspares - os Cristãos prezando as EScrituras; os descrentes ingorando a sua natureza e validade como fonte de aferição da nossa existência. Na ciência de que o pecado obscurece a razão (percepção) e o raciocínio (método de assimilação da comunicação), mesmo assim partimos da pressuposição de que a graça comum de Deus permite os lampejos de lucidez na humanidade, que possibilitam a existência na terra, devemos argumentar pela verdade, alicerçados na verdade e defendendo a verdade, deixando claras as nossas premissas teocêntricas.

    Um abraço,

    Solano

    ResponderExcluir
  9. "É errado acharmos que os meios de comunicação são veículos neutros, quando se encontram sobre o direcionamento e administração de homens (2 Jo 1.1-11)."

    Concordo com o senhor, Professor Solano Portela. Os jornalistas chama a isso que o senhor falou de "viés". Cada notícia tem um viés, que é a opinião do jornalista, mesmo que travestida ou escondida. O pessoal de literatura chama isso de Semiótica. Hoje em dia eles perderam a vergonha e defendem abertamente temas que, por vergonhosos, não poderiam defender à luz do dia, tais como aborto, união homossexual, comunismo, ditadura do Estado esquerdista, liberalização do uso da maconha...

    Marcelo Hagah
    João Pessoa-PB

    ResponderExcluir