Os liberais gostam de posar de contemporâneos e relevantes em sua teologia, enquanto que apresentam aqueles que prezam as Escrituras como partidários de uma teologia retrógrada e atrasada. Referindo-se aos conservadores, um professor de seminário escreveu, recentemente, “insistir na retórica teológica oitocentista, é responder a perguntas que ninguém mais está fazendo”.
Os documentos e credos históricos, como a Confissão de Fé de Westminster, são rejeitados e ridicularizados e o moto da Reforma – Sola Scriptura – é olhado com desdém. A Bíblia não é aceita como singular, pertinente, revelativa e fonte de autoridade. Em sua "tolerância" lupina que encobre real intolerância, acusam os conservadores de terem uma compreensão que não somente é inválida, mas também prejudicial à igreja e à sociedade contemporânea.
Enquanto esbravejam e se revoltam contra aqueles que rotulam de “donos da verdade”, por acreditarem na verdade da Palavra de Deus, dedicam-se a uma teologia meramente especulativa. Rejeitando a fonte básica da teologia – as Escrituras, a relevância, para os liberais, é supostamente obtida em compêndios sociológicos e em um envolvimento social mal direcionado; ou em tratados filosóficos que se propõem a analisar as práticas discursivas dos oponentes, imprimindo novos significados à existência da humanidade. Essa visão leva freqüentemente a um hiper-ativismo social, que é alienador da verdadeira espiritualidade. Esse é o caso, por exemplo, da “teologia” da libertação, da “teologia” do processo e de outros ramos “teológicos” peculiares à era pós-moderna na qual nos situamos.
Acontece que teologia especulativa tem existido há séculos. Na igreja primitiva, já existia nos gnósticos e se faz presente hoje como ocorrerá no dia de amanhã. A conseqüência nefasta desse afastamento da ortodoxia e da fé cristã histórica é a cauterização de milhares de mentes que, julgando-se autônomas de um Deus retratado como não sendo soberano, rejeitam a mensagem do evangelho salvador de Cristo, e entregam-se a especulações vãs e mortais, no sentido mais eterno possível.
Mas quão relevante e contemporânea é, realmente, a “teologia” especulativa dos liberais? Será que teologia, como querem nos convencer, é algo comparável ao iogurte que perde sua validade dentro de algum tempo e, como conseqüência temos que estar apegados ao último modismo? Devemos rejeitar autores clássicos, como Hodge, Warfield, Kuyper, Berkhoff e outros que procuram e manter fiéis à Escritura, por serem “antiquados”? E quão moderna e atualizada é realmente essa “teologia” liberal?
Correção teológica não é simplesmente uma questão de se rejeitar o antigo e se apegar ao contemporâneo. Autores clássicos podem ser rejeitados por refletirem o ensinamento das Escrituras, mas teologia especulativa não é uma descoberta recente nem uma marca de modernidade, pós-modernidade ou contemporaneidade. Ao longo de toda a história da igreja heresias racionalistas têm surgido, com maior ou menor intensidade. Os liberais apresentam, na realidade, apenas uma mímica mal-feita do racionalismo alemão de F. D. R. Schleiermacher (1768-1834), de A. Ritschl (1822-1889) e outros que se esmeraram em questionar a historicidade dos pontos de fé do cristianismo nos idos do século 18 e 19. Logo eles, que se rebelam contra uma “teologia oitocentista”, vão beber na fonte de autores desacreditados no campo da ortodoxia cristã. Tanto saudosismo poderia, pelo menos, tê-los levado à opção correta pelos “oitocentistas” fiéis às Escrituras.
Essa rejeição latente da teologia clássica e a busca incessante pela descoberta da pólvora teológica os afastam mesmo é da cena contemporânea, lançando-os sob as asas de racionalistas setecentistas, por mais atualizados que queiram parecer.
Como Deus nos protege?
Há 10 horas
14 comentários
comentáriosSolano,
Responderpelo que os irmãos do blog tem escrito , a teologia liberal e neo-liberal são pensamentos antigos (gnosticismo,...) apenas com roupagem mais evoluída.
Existe uma corrente mais racionalista que quer submeter a teologia a pensamentos de feuerbach, Darwin, Marx, Freud e Nietzsche que são inimigos declarados do cristianismo.
Porém tem uma corrente mais do estilo de C. Jung (gnóstico) que se apresenta como "amigo" do cristianismo (o falso amigo, pior do que o inimigo) que deve representar a maior parte dos neo-liberais aqui no Brasil.
Esses ai dizem ser inconcebível a fé cristã histórica no contexto da pós-modernidade.
Creio que o texto de Romanos 12:1 se encaixa perfeitamente. O de 1 Co 1:18-31 também.
Que Deus nos sutente no "velho", "bom" e "ultrapassado" evangelho, porque foi esse que livrou nossa alma da condenação eterna.
Segundo um livreto do Rev. Augustus, a posição apostólica era claramente dura contra os mestres que ensinavam algo fora da doutrina cristã. Havia, no entanto, uma tolerância aos cristãos que seguiam estes desvios. Creio que esta deveria ser também a nossa postura como cristão, ou seja, contundentes contra o falso ensino, e mais pacientes/complacentes com os que foram enganados a fim de levá-los novamente ao acerto.
ResponderSolano,
ResponderSeu insight é muito pertinente: não há nada de novo nas propostas recentes de autores e teólogos que costumam desprezar a teologia clássica. O chamado à espiritualidade, por exemplo, se inspira nos contemplativos do deserto, lá da Idade Média. A teologia relacional se proclama um avanço no entendimento cristão de Deus e da história, contudo o âmago de suas idéias se encontra em Lélio Socínio, contestador de Calvino e Lutero. E como você disse, os conceitos neoliberais têm raízes no pensamento de autores do séc. 18 para cá. Li ontem no site Teologia Brasileira, da editora Vida Nova, mais um artigo detonando a Igreja por aprisionar a “mística” (?), mas que não propõe nada que seja realmente novo no lugar.
Mais um exemplo. A Editora Novo Século reeditou a obra Antologia Teológica, uma coletânea de artigos das mais variadas persuasões teológicas, de conservadores a liberais, e no prefácio, diz que o livro tem um caráter apologético contra o fundamentalismo obscurantista dentro do evangelicalismo brasileiro. É curiosa, no mínimo, a declaração da Editora que a obra fortalece o fazer teológico “genuinamente brasileiro e contemporâneo”, considerando que as seleções, na grande maioria, são de autores estrangeiros a maioria dos quais de séculos anteriores.
Recomendo a todos dois artigos que foram publicados recentemente na Fides Reformata (volume X, número 1, 2005), sobre o liberalismo teológico. Um, de Costanza, sobre as origens históricas, e outro, da minha autoria (perdoem a auto-indicação), sobre o fracasso do método histórico-crítico de interpretação. Quem quiser a Fides pode adquiri-la pelo telefone (11) 3236.8644 ou pos.teo@mackenzie.com.br.
Abraços.
Cleber,
ResponderSeja bem vindo! Aguardamos sua participação!
Um abraço.
Leo, o motivo de tantos posts pode ser facilmente explicado devido ao fato do liberalismo teológico ser uma das principais (se não a principal) ameaças à pureza doutrinária nos dias atuais. Até porque não tem uma forma fixa, você combate els hoje e amanhã já mudaram de forma (embora os princípios sejam sempre os mesmos).
ResponderAbraços
Leo,
ResponderVocê tem razão. Ainda hoje Solano e eu estávamos conversando e um dos assuntos foi que deveríamos focar também em outras questões que estão na mente dos evangélicos. Prometemos novos temas em breve.
Para azar meu, acabo de publicar mais um post sobre liberalismo -- era o último que eu pretendia publicar, pode acreditar. Espero que sirva para elucidar um ou outro ponto que talvez não tenha ficado claro, sobre a real natureza do liberalismo.
É verdade que os liberais não se consideram como tais, a não ser um ou outro que conheci e que assumia abertamente. Mas de qualquer forma, os posts não foram escritos para eles, mas para os que estão sendo influenciados por alguma forma de liberalismo e precisam de ajuda para definir claramente aquilo que instintivamente já sentiram que está errado.
Um abraço.
Juan: Realmente, muda a roupagem, mas a essência é a mesma. Schaeffer chamava o liberalismo de adultério espiritual. Como bem identifica o Augustus, daquele tipo que quer manter os dois relacionamentos, quando o verdadeiro clama por exclusividade e honestidade. É muito mais fácil a identificação quando os inimigos são declaradamente antagonistas, mas o veneno é por vezes mais mortal quando encoberto pela sutileza do linguajar pseudo cristão e benevolente.
ResponderSamuelObrigado pelas palavras. Foi muito bom lhe encontrar, novamente, logo no início o ano. Realmente, não devemos fugir de nossas obrigações de sermos proclamadores do evangelho. Se brandimos a espada, deve ser a do Espírito. Por amor à igreja, devemos "defender a fé uma vez por todas entregue aos santos". Por amor a eles, devemos apresentar o Evangelho que salva, em toda sua singeleza e poder.
Solano
Leo: Vou mudar o disco, mas de vez em quando desenterrarei o defunto...
ResponderSolano
Ah, não! Que história é essa de falar menos dos liberais? Pelo contrário, precisamos falar mais! Mais de seus conteúdos, de suas roupagens, de sua história, de suas sutilezas... Afinal, os liberais representam a (pós-)modernidade se infiltrando na igreja, e quer inimigo mais perigoso (e mais abrangente) que a (pós-)modernidade??? Para o teólogo verdadeiramente convertido, esse é o dever número 1!
ResponderAssim, Augustus, Solano e Mauro: não desistam! Vamos continuar batendo nos liberais!!!
:-)))))
Grande abraço do pelotão vizinho!
Caro Cléber:
ResponderO problema é que "liberal", ou "neo-liberal", no sentido econômico, tem um sentido quase inverso do sentido teológico.
Para complicar mais, "liberal" no sentido político-econômico norte-americano, tem um sentido igualmente contrário ao termo, quando utilizado no sentido europeu e entre nós.
Nos Estados Unidos, "liberal", politica e economicamente falando, é o que se declara LIVRE de certos princípios básicos que nortearam a fundação daquela nação e se mostram partidário de um governo centralizadamente forte, messiânico e paternalista. O oposto de "liberal", lá, é "conservador". Nesse sentido, há uma certa equivalência com os termos teológicos - os liberais são de esquerda e os conservadores de direita (se bem que pelos padrões brasileiros, os dois são considerados de direita - como é tudo que "cheira" a americano).
No nosso contexto (refletindo o europeu), "liberal" ou "neo-liberal" é o que postula a libertação das amarras do governo. É o que é, exatamente, CONTRA o estado centralizador, onipotente e messiânico. É o que defende a livre iniciativa, o direito de propriedade e o que afirma que a coletividade é melhor servida quando os direitos e iniciativas individuais são reforçadas e respeitadas.
Realmente, entre as interessantíssimas idéias apresentadas por Alfred Von Hayek, o conceito de demarquia (regência pela maioria, mas dentro de parâmetros legais e princípios universais não modificáveis por essa maioria) em contraponto à democracia ampla, é a cristalização de uma visão que muito se aproxima do conceito bíblico do estado. Democracia seria simplesmente uma foma administrativa de governar, mas não um sistema gerador de leis (que é a distorção contemporânea, na qual vivemos); definidor do certo e do errado.
Explorar essas idéias e correlacioná-las com as Escrituras é um excelente exercício. Os cristãos coerente serão levados a concluir que temos que procurar a âncora do certo e do errado; do que é verdadeiro e do que é falso, fora da regência da maioria - ou seja, algo não se torna certo, se é errado, simplesmente porque a maioria assim quiz ou votou - diretamente ou através de seus representantes.
Mas isso já é outra história...
Abs
Solano
Cleber,
ResponderÉ um prazer "revê-lo"!
Creio que o Solano já respondeu sua indagação sobre neoliberalismo. Vou apenas acrescentar o seguinte.
Os neoliberais são aqueles que abraçaram a posmodernidade sem renegar os pressupostos teológicos do antigo liberalismo teológico. Eles empregam a linguagem das hermenêuticas pós-modernas, usam conceitos das filosofias mais atuais (quase todas filhas do existencialismo) mas continuam sendo liberais (teologicamente) no que crêem acerca da Bíblia e da teologia cristã clássica.
Eles têm muitas formas. Estão tanto no protestantismo quanto no catolicismo. Estão envolvidos em diferentes frentes de luta, mas convergem nesse ponto: o que pensam acerca da Bíblia, que é a velha postura do liberalismo teológico (cheia de erros, mitos e fábula, etc.).
Um abraço.
Pastor Solano, eu sei que aqui não é um blog de economia, mas permita-me dar um opinião sobre liberalismo econômico.
ResponderCleber, sinceramente não entendi a sua definição ao se descrever como neo-liberal e logo após apontar Hayek, na realidade Hayek não pode nunca ser considerado neo-liberal e sim um liberal no sentido clássico do termo.
Talvez você esteja se auto-denominando com o termo que os inimigos do liberalismo acabam nos rotulando e com um sentido pejorativo.
Pois como já disse uma vez o filósofo Olavo de Carvalho, "neo-liberalismo é um socialismo meia-bomba misturado com um liberalismo meia-bomba".
Aguardo um esclarecimento.
Norma, eu me senti do mesmo jeito com essa história de falar menos dos liberais.
Solano, faco minhas as palavras da Norma e do David, precisamos "martelar" e muito na questao do "outro evangelho" que tem surgido e influenciado o meio evangelico.
ResponderO processo da apostasia, pensavamos, seria de um desvio "visivel" e "palpavel", nunca poderiamos imaginar que a partir da igreja pudesse haver ao maior ataque contra a pureza da mensagem da cruz. Por isso tantas pessoas aceitam e se submetem a esta nova teologia.
Augustus, estive lendo tambem o Teologia Brasileira e fiquei impressionado com os artigos do Sr. Carvalhaes, como alguem pode ser tao ecumenico assim? promovendo a espiritualidade dos cultos afro-brasileiros como a base da nossa espiritualidade geral...
Abraco a todos!!
Caro Wilson Bento,
ResponderPois é, às vezes me questiono se deveria continuar a ser comentarista daquele site. Por um lado não gosto de passar a impressão que concordo com o que se publica ali. Por outro, se os conservadores abrirem mão de seus espaços, em breve estaremos mais ilhados ainda. É sempre uma tensão...
Um abraço.