quarta-feira, novembro 29, 2006

Augustus Nicodemus Lopes

O Homem na Caixa

Por     12 comentários:
[Ano passado, entre as diversas oportunidade que tive de falar a professores e autoridades universitárias, toquei no assunto da visão de mundo do Cristianismo usando a famosa pintura de Bacon "A Cabeça". Todos perceberão a influência de Schaeffer via Rookmaker nesse post. Como a produção de todos os autores do blog anda meio baixa (todo mundo ocupado demais com a chegada do fim do ano), reproduzo-a aqui com poucas adaptações.]
Deus... fez toda a raça humana para habitar sobre toda a face da terra, havendo fixado os tempos previamente estabelecidos e os limites da sua habitação; para buscarem a Deus se, porventura, tateando, o possam achar, bem que não está longe de cada um de nós” (Atos 17.26-28).

Nas palavras de Paulo aos filósofos estóicos e epicureus encontramos uma síntese da visão cristã de realidade: vivemos num mundo criado por Deus, o qual se encontra próximo de nós, embora muitos o procurem como cegos que tateiam seu caminho. Ou seja, vivemos numa realidade aberta.

O quadro que ilustra minha fala é de Francis Bacon – não o filósofo inglês do século XVI, mas o pintor inglês, natural de Dublin, nascido em 1909, falecido em 1992. Controverso, excêntrico, ficou famoso pelos quadros de figuras humanas grotescas, desfiguradas e horrendas, às vezes misturadas com animais. Um dos quadros mais famosos é “Cabeça IV”, de 1949, reproduzido acima. Conforme H. Rookmaker, professor de história da arte da Universidade Livre de Amsterdam, “Os quadros de Bacon são como caricaturas da humanidade, e não imagens humorísticas. São gritos altos de desespero por valores perdidos e grandeza perdida”.

Tomemos este quadro como uma expressão dos sentimentos mais profundos de Bacon e de sua geração, que é basicamente a nossa. O que podemos aprender com o homem na caixa? De que modo ele percebe a realidade?

Primeiro, embora exista uma realidade ao seu redor, ele só pode perceber como real o que se encontra dentro da caixa.

Segundo, seu mundo é fechado. Nada entra e nada sai. Portanto, seu grito é vazio. Ninguém o ouve.

Terceiro, se existir uma realidade além da caixa, e esta resolver responder e se aproximar, o homem na caixa não poderia ouvi-lo.

O quadro de Bacon representa bem a situação do homem moderno após o período do Iluminismo e da prevalência do cientificismo na academia e posteriormente na cultura ocidental. Antes do chamado período moderno, o conhecimento, as artes e a cultura em geral eram influenciadas por uma visão de mundo e de realidade moldada nos princípios e valores do Cristianismo.

O Cristianismo da Reforma protestante, com sua afirmação de que o mundo foi criado por Deus e que funciona seguindo a lei da causalidade, ela própria criada por Deus, havia libertado a mente humana do medo de ofender os deuses pela pesquisa do mundo e da natureza, e havia desfeito a dualidade oriunda do gnosticismo e perpetuada por Tomas de Aquino entre natureza e graça. Tudo isto contribuiu significativamente para o surgimento da cultura ocidental e um renovado apreço pelas artes, juntamente com o Humanismo.

Muitos dos grandes artistas, pintores, músicos, escritores, cientistas e pesquisadores deste período professavam a fé em Deus ao mesmo tempo em que se dedicavam a conhecer, pesquisar, explorar e desenvolver o mundo criado por Deus. Criam num mundo regido por leis naturais, ao mesmo tempo sustentado por Deus e passível de ser tocado pelo Criador, que providencialmente agia no mundo, na vida das pessoas, na história.

Contudo, com o advento da chamada idade da razão – melhor dizendo, do racionalismo, em meados do século dezessete, o homem abandonou esta perspectiva e passou a determinar a realidade através dos sentidos e da razão: só existe aquilo que for perceptível pelos sentidos e comprovado pela razão. Como Deus e o sobrenatural não podem ser comprovados por estes cânones, por mais gentil que ele fosse, foi convidado a se retirar do novo mundo criado pelo racionalismo. O homem constrói ao seu redor uma realidade fechada, um mundo governado pela lei férrea da causa e do efeito, onde a realidade é somente aquilo que a razão e os sentidos podem perceber. O homem se fechou numa caixa. Mas, tudo isto lhe era imperceptível, então, dominado que estava pela euforia de criar um admirável mundo novo, que ele haveria de dominar pelo cientificismo tecnológico.

Passados três séculos, o homem começa a sentir, hoje, os efeitos inevitáveis de estar na caixa. Os sinais disto estão em todo lugar: primeiro, nas artes, que na tentativa de achar sentido para a realidade, resolveu pular fora da caixa, em protesto contra a visão reducionista do positivismo do século XIX, sem contudo saber ao certo o que lhe espera do lado de fora. Artistas como Francis Bacon, e muitos outros refletem o desespero e a angústia das almas mais sensíveis que simplesmente desistiram de entender e expressar a realidade de forma sintética e coerente.

A filosofia, igualmente, foi dominada pelo existencialismo, que em suas mais diversas linhas, convida o homem a uma experiência fora da caixa, experiência que não tenha necessariamente sentido nem razão, e que não seja controlada por conceitos como certo ou errado, muito bem popularizadas pelo famoso filósofo brasileiro (risos) Roberto Carlos na música Emoções, onde canta “se sofri ou se sorri, o importante é que emoções eu vivi”.

Surge a posmodernidade, que sem negar que a realidade de fato está contida na caixa, contudo contesta a existência da própria caixa, e – por que também não, -- do próprio homem e da realidade ao seu redor.

Propostas religiosas antigas, como o monismo religioso, que vê a realidade como se fosse um tecido único, como se tudo fosse Deus e Deus fosse tudo, ressurgem inclusive dentro da Cristandade mais ampla, como por exemplo, nas 95 teses de Matthew Cox, leigo católico, pregadas na mesma porta de Wittemberg na Alemanha mês passado, onde diz na tese número seis: “A idéia de que Deus está acima ou além do universo é falsa. Tudo está em Deus e Deus está em tudo”.

Tudo isto, e outras coisas mais, é o grito tremendo do homem na caixa. O homem moderno não consegue mais viver dentro dela. Quer respostas, quer sentido, quer razões, quer ser ouvido.

O que tudo isto tem a ver conosco? Creio que nosso maior desafio consiste nestes três pontos. Primeiro, perceber que boa parte do desespero e do vazio existencial hoje reinantes nas mentes e corações de todos, apesar das grandes conquistas intelectuais e advanços tecnológicos da humanidade, provém de uma visão reduzida da realidade, uma visão que pode muito bem ser exemplificada com a pintura de Francis Bacon.

Segunda, que talvez devêssemos considerar o passado e a história e aprender com aqueles que, sem negar a intelectualidade, a objetividade científica e a respeitabilidade acadêmica, estavam preparados para aceitar que a realidade é mais ampla e mais profunda do que aquilo que percebemos, vemos, ouvimos, tocamos e comprovamos. A caixa precisa ser aberta. Há um mundo maravilhoso, rico, misterioso e plenamente satisfatório lá fora.

Não os convido a saltar da caixa no escuro. Mas recomendo às suas mentes brilhantes e privilegiadas o Cristianismo bíblico, como uma visão de mundo e realidade que contempla e abrange a realidade de uma forma muito mais completa, e onde Deus não está longe de nenhum de nós.

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segunda-feira, novembro 20, 2006

Augustus Nicodemus Lopes

A Alma Católica dos Evangélicos no Brasil

Os evangélicos no Brasil nunca conseguiram se livrar totalmente da influência do Catolicismo Romano. Por séculos, o Catolicismo formou a mentalidade brasileira, a sua maneira de ver o mundo ("cosmovisão"). O crescimento do número de evangélicos no Brasil é cada vez maior – segundo o IBGE, seremos 40 milhões esse ano de 2006 – mas há várias evidências de que boa parte dos evangélicos não tem conseguido se livrar da herança católica.

É um fato que conversão verdadeira (arrependimento e fé) implica numa mudança espiritual e moral, mas não significa necessariamente uma mudança na maneira como a pessoa vê o mundo. Alguém pode ter sido regenerado pelo Espírito e ainda continuar, por um tempo, a enxergar as coisas com os pressupostos antigos. É o caso dos crentes de Corinto, por exemplo. Alguns deles haviam sido impuros, idólatras, adúlteros, efeminados, sodomitas, ladrões, avarentos, bêbados, maldizentes e roubadores. Todavia, haviam sido lavados, santificados e justificados "em o nome do Senhor Jesus Cristo e no Espírito do nosso Deus" (1Co 6.9-11) sem que isso significasse que uma mudança completa de mentalidade houvesse ocorrido com eles. Na primeira carta que lhes escreve, Paulo revela duas áreas em que eles continuavam a agir como pagãos: na maneira grega dicotômica de ver o mundo dividido em matéria e espírito (que dificultava a aceitação entre eles das relações sexuais no casamento e a ressurreição física dos mortos – capítulos 7 e 15) e o culto à personalidade mantido para com os filósofos gregos (que logo os levou à formar partidos na igreja em torno de Paulo, Pedro, Apolo e mesmo o próprio Cristo – capítulos 1 a 4). Eles eram cristãos, mas com a alma grega pagã.

Da mesma forma, creio que grande parte dos evangélicos no Brasil tem a alma católica. Antes de passar às argumentações, preciso esclarecer um ponto. Todas as tendências que eu identifico entre os evangélicos como sendo herança católica, no fundo, antes de serem católicas, são realmente tendências da nossa natureza humana decaída, corrompida e manchada pelo pecado, que se manifestam em todos os lugares, em todos os sistemas e não somente no Catolicismo. Como disse o reformado R. Hooykas, famoso historiador da ciência, “no fundo, somos todos romanos” (Philosophia Liberta, 1957). Todavia, alguns sistemas são mais vulneráveis a essas tendências e as absorveram mais que outros, como penso que é o caso com o Catolicismo no Brasil. E que tendências são essas?

1) O gosto por bispos e apóstolos – Na Igreja Católica, o sistema papal impõe a autoridade de um único homem sobre todo o povo. A distinção entre clérigos (padres, bispos, cardeais e o papa) e leigos (o povo comum) coloca os sacerdotes católicos em um nível acima das pessoas normais, como se fossem revestidos de uma autoridade, um carisma, uma espiritualidade inacessível, que provoca a admiração e o espanto da gente comum, infundindo respeito e veneração. Há um gosto na alma brasileira por bispos, catedrais, pompas, rituais. Só assim consigo entender a aceitação generalizada por parte dos próprios evangélicos de bispos e apóstolos auto-nomeados, mesmo após Lutero ter rasgado a bula papal que o excomungava e queimá-la na fogueira. A doutrina reformada do sacerdócio universal dos crentes e a abolição da distinção entre clérigos e leigos ainda não permearam a cosmovisão dos evangélicos no Brasil, com poucas exceções.

2) A idéia que pastores são mediadores entre Deus e os homens – No Catolicismo, a Igreja é mediadora entre Deus e os homens e transmite a graça divina mediante os sacramentos, as indulgências, as orações. Os sacerdotes católicos são vistos como aqueles através de quem essa graça é concedida, pois são eles que, com as suas palavras, transformam, na Missa, o pão e o vinho no corpo e no sangue de Cristo; que aplicam a água benta no batismo para remissão de pecados; que ouvem a confissão do povo e pronunciam o perdão de pecados. Essa mentalidade de mediação humana passou para os evangélicos, com algumas poucas mudanças. Até nas igrejas chamadas históricas os crentes brasileiros agem como se a oração do pastor fosse mais poderosa do que a deles, e que os pastores funcionam como mediadores entre eles e os favores divinos. Esse ranço do Catolicismo vem sendo cada vez mais explorado por setores neopentecostais do evangelicalismo, a julgar por práticas já assimiladas como “a oração dos 318 homens de Deus”, “a prece poderosa do bispo tal”, “a oração da irmã fulana, que é profetisa”, etc.

3) O misticismo supersticioso no apego a objetos sagrados
– O Catolicismo no Brasil, por sua vez influenciado pelas religiões afro-brasileiras, semeou misticismo e superstição durante séculos na alma brasileira: milagres de santos, uso de relíquias, aparições de Cristo e de Maria, objetos ungidos e santificados, água benta, entre outros. Hoje, há um crescimento espantoso entre setores evangélicos do uso de copo d’água, rosa ungida, sal grosso, pulseiras abençoadas, pentes santos do kit de beleza da rainha Ester, peças de roupa de entes queridos, oração no monte, no vale; óleos de oliveiras de Jerusalém, água do Jordão, sal do Vale do Sal, trombetas de Gideão (distribuídas em profusão), o cajado de Moisés... é infindável e sem limites a imaginação dos líderes e a credulidade do povo. Esse fenômeno só pode se explicado, ao meu ver, por um gosto intrínseco pelo misticismo impresso na alma católica dos evangélicos.

4) A separação entre sagrado e profano – No centro do pensamento católico existe a distinção entre natureza e graça idealizada e defendida por Tomás de Aquino, um dos mais importantes teólogos da Igreja Católica. Na prática, isso significou a aceitação de duas realidades co-existentes, antagônicas e freqüentemente irreconciliáveis: o sagrado, substanciado na Santa Igreja, e o profano, que é tudo o mais no mundo lá fora. Os brasileiros aprenderam durante séculos a não misturar as coisas: sagrado é aquilo que a gente vai fazer na Igreja: assistir Missa e se confessar. O profano – meu trabalho, meus estudos, as ciências – permanece intocado pelos pressupostos cristãos, separado de forma estanque. É a mesma atitude dos evangélicos. Falta-nos uma mentalidade que integre a fé às demais áreas da vida, conforme a visão bíblica de que tudo é sagrado. Por exemplo, na área da educação, temos por séculos deixado que a mentalidade humanista secularizada, permeada de pressupostos anticristãos, eduque os nossos filhos, do ensino fundamental até o superior, com algumas exceções. Em outros países os evangélicos têm tido mais sucesso em manter instituições de ensino que além de serem tão competentes como as outras, oferecem uma visão de mundo, de ciência, de tecnologia e da história oriunda de pressupostos cristãos. Numa cultura permeada pela idéia de que o sagrado e profano, a religião e o mundo, são dois reinos distintos e frequentemente antagônicos, não há como uma visão integral surgir e prevalecer a não ser por uma profunda reforma de mentalidade entre os evangélicos.

5) Somente pecados sexuais são realmente graves A distinção entre pecados mortais e veniais feita pelo romanismo católico vem permeando a ética brasileira há séculos. Segundo essa distinção, pecados considerados mortais privam a alma da graça salvadora e condenam ao inferno, enquanto que os veniais, como o nome já indica, são mais leves e merecem somente castigos temporais. A nossa cultura se encarregou de preencher as listas dos mortais e dos veniais. Dessa forma, enquanto se pode aceitar a “mentirinha”, o jeitinho, o tirar vantagem, a maledicência, etc., o adultério se tornou imperdoável. Lula foi reeleito cercado de acusações de corrupção. Mas, se tivesse ocorrido uma denúncia de escândalo sexual, tenho dúvidas de que teria sido reeleito, ou que teria sido reeleito por uma margem tão grande. Nas igrejas evangélicas – onde se sabe pela Bíblia que todo pecado é odioso e que quem guarda toda a lei de Deus e quebra um só mandamento é culpado de todos – é raro que alguém seja disciplinado, corrigido, admoestado, destituído ou despojado por pecados como mentira, preguiça, orgulho, vaidade, maledicência, entre outros. As disciplinas eclesiásticas acontecem via de regra por pecados de natureza sexual, como adultério, prostituição, fornicação, adição à pornografia, homossexualismo, etc., embora até mesmo esses estão sendo cada vez mais aceitáveis aos olhos evangélicos. Mais um resquício de catolicismo na alma dos evangélicos?

O que é mais surpreendente é que os evangélicos no Brasil estão entre os mais anti-católicos do mundo. Só para ilustrar (e sem entrar no mérito dessa polêmica) o Brasil é um dos poucos países onde convertidos do catolicismo são rebatizados nas igrejas evangélicas. O anti-catolicismo brasileiro, todavia, se concentrou apenas na questão das imagens e de Maria, e em questões éticas como não fumar, não beber e não dançar. Não foi e não é profundo o suficiente para fazer uma crítica mais completa de outros pontos que, por anos, vêm moldando a mentalidade do brasileiro, como mencionei acima. Além de uma conversão dos ídolos e de Maria a Cristo, os brasileiros evangélicos precisam de conversão na mentalidade, na maneira de ver o mundo. Temos de trazer cativo a Cristo todo pensamento e não somente os nossos pecados. Nossa cosmovisão precisa também de conversão (2Coríntios 10.4-5).

Quando vejo o retorno de grandes massas ditas evangélicas às práticas medievais católicas de usar no culto a Deus objetos ungidos e consagrados, procurando para si bispos e apóstolos, imersas em práticas supersticiosas, me pergunto se, ao final das contas, o neopentecostalismo brasileiro não é, na verdade, um filho da Igreja Católica medieval, uma forma de neo-catolicismo tardio que surge e cresce em nosso país onde até os evangélicos têm alma católica.

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domingo, novembro 12, 2006

Mauro Meister

A anatomia da perseverança dos santos


Hoje à noite (domingo) tive o privilégio de interpretar o pr. Iain Murray pregando no texto de Mateus 11:28, em nossa igreja (Igreja Presbiteriana da Lapa). O pr. Murray nasceu em 1931 e começou no ministério pastoral em 1955. Foi pastor auxiliar do Dr. Lloyd-Jones e também pastoreou em Sydney, na Austrália. Foi um dos fundadores do Banner of Truth Trust, (1965) e, atualmente, é o diretor editorial deste importante ministério reformado.

Pr. Murray está no Brasil, com sua esposa Jean, para pregar no Encontro da Fé Reformada (Manaus e Goiânia) nas duas próximas semanas. São 55 anos de fiel ministério da palavra e, com uma vida assim, temos centenas de lições a aprender, entre elas:

1) Que um grande ministério não precisa ser um mega ministério. As obras que Deus colocou no caminho desse seu servo são, indubitavelmente, grandiosas. Porém, vendo-o pregar, não se vê uma 'estrela', mas um homem que abre a Palavra de Deus de maneira simples e poderosa, sem atrair qualquer atenção para si mesmo, exemplo de pregação simples e fiel.

2) Entre as muitas coisas preciosas que ouvi e traduzi, uma foi o simples conselho de que o povo de Deus pode e precisa aprender com a vida dos santos que nos é apresentada na História da Igreja. Tendo sido o pastor auxiliar de Lloyd-Jones, pr. Murray escreveu uma biografia (publicada pela PES, no Brasil), destacando como o ministério de pregação do "doutor" alcançou repercursão mundial pela sua fidelidade às Escrituras e pelo equilibrio na aplicação da mesma (isto claramente visto nas suas correspondências organizadas por Murray e, também, publicadas pela PES). Aprendamos com o santos e fiquemos alertas com os que caem.

3) Olhando para um ministério como este, e outros (estava presente no culto o Rev. Francisco Leonardo Schalkwijk, que foi missionário no Brasil durante décadas), reacende-se a esperança de que, apesar de tantas quedas que vemos ao nosso redor, a fidelidade do Senhor preserva os seus santos para que passem por muitas lutas no ministério e cheguem até o fim para dizer como Paulo: "Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé." (2 Tm 4.7 )

4) Aprendi, também, que diante das muitas lutas, a graça de Deus pode manter a nossa lucidez, o bom-senso e a própria razão. Com certeza temos muitas lutas externas e nossa própria guerra contra o pecado. Creio que a simplicidade no evangelho pode nos manter longe do cinismo e racionalização que muitas vezes toma conta da vida íntima daqueles que caíram. Estes que chegam ao fim em pé, com certeza, viram muitos cair e seguiram o conselho: "Aquele, pois, que pensa estar em pé veja que não caia." (1 Co 10.12)

Estou dizendo isto porque a queda de Haggard me impressionou muito. Aliás, não a queda dele, especificamente, mas a queda de homens que lutam para viverem como 'homens de Deus'. Ver o pr. Murray pregando, depois de 55 anos de ministério, me trouxe alento e estímulo para permanecer fiel a Deus e a sua santa palavra.

Minha oração nesta noite é: Senhor, obrigado pela promessa da perseverança. Faça-a visivel na minha vida e mantém a integridade do ministério que o Senhor colocou em minhas mãos.

Esboço do texto de Mateus 11.28:
"Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei."

1. O convite do Senhor: vinde a mim
2. A abrangência do convite: todos que estais cansados e sobrecarregados
3. A promessa: e eu vos aliviarei
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terça-feira, novembro 07, 2006

Augustus Nicodemus Lopes

A Anatomia de uma Queda

Por     47 comentários:
Pois é, mais um escândalo na nossa conta. Caiu o Ted Haggard (foto), famoso pastor pentecostal nos Estados Unidos -- um dos vinte e cinco evangélicos mais conhecidos e influentes daquele país, segundo a revista Time, apontado como sucessor de Billy Graham. Haggard foi demitido de sua igreja e despojado do pastorado, depois que um prostituto gay denunciou que por três anos foi cliente de Haggard. Após uma negação inicial, veio a confissão. Haggard caiu, e com ele cairam algumas coisas.

1) Caiu a confiabilidade dos megaministérios. Como disse Montaigne, "Não importa a altura do trono, o rei ainda senta-se no seu traseiro." Algo anda errado no evangelicalismo mundial das últimas décadas. Jim Baker, Jimmy Swaggart, entre outros, e agora Ted Haggard, todos com perfis similares: megastars, pastores de megaigrejas, em cujas paredes seus retratos se dependuravam em profusão, líderes de cruzadas morais, estrelas de programas evangélicos de televisão. Só me lembro de Provérbios: "a soberba precede a queda". Não estou dizendo que todo megapastor é soberbo e sim que eles se tornam vulneráveis com maior facilidade.

2) Caiu a certeza de que ser gay é realmente uma escolha moral. Gays em todo mundo se regozijaram com a queda de Haggard e se fortaleceram na confiança de que ser gay é genético. Agora ficou ainda mais fácil acreditar que quem é, é mesmo, não tem como lutar contra, ainda que passe a vida numa cruzada heterossexual contra os gays, como Tedd Haggard.

3) Caiu o último escrúpulo daqueles que só estavam esperando um sinal das circunstâncias para cruzar a linha final. "Se Haggard, sendo pastor famoso, viveu vida dupla durante muitos anos, por que eu não posso fazer a mesma coisa?" Só Deus sabe quantos não foram encorajados a cair também com Haggard.

4) Caíram um pouco mais as chances de que faremos parte daqueles poucos que terminam seus ministérios honrados, incólumes e de ficha limpa, ao mesmo tempo em que aumentou a desconfiança de que podem haver muitos mais como Ted Haggard, totalmente envolvidos com o ministério cristão, líderes espirituais, pastores de igrejas e ao mesmo tempo vivendo uma vida dupla. Nos Estados Unidos e no Brasil.

5) Caiu um pouco mais a sensação de vergonha e de culpa (quando existente) de ex-líderes evangélicos, que caíram antes e foram disciplinados, despojados e ostracizados pelo público evangélico que antes os idolatrava. "Ah, mais um. Não fui o único. Outros também caem. Quantos mais caírem, menos me sentirei culpado e discriminado. Queria ver agora a cara dos fariseus que me condenaram”.

6) Caiu o nosso semblante diante dos gritos de alegria, escárnio, zombaria e malícia dos inimigos de Deus e da Igreja. Leia os comentários dos ímpios nos sites que publicaram a notícia da queda de Haggard. Em alguns, recomendam que Haggard se suicide. Outros, rejubilam-se com sua queda e com a "prova" de que a religião nada mais é que repressão. Outros, blasfemam contra Deus e contra Cristo. Meu coração se aperta e oro "não sejam envergonhados por minha causa os que esperam em ti, ó Deus de Israel" (Salmo 69.6).

Contudo, ao mesmo tempo em que essas coisas caíram com Ted Haggard, outras subiram.

1) Subiu o conceito bíblico da responsabilidade de darmos contas de nosso pastorado. Embora Haggard fosse um megapastor de uma igreja de cerca de 10 mil pessoas, estava debaixo da autoridade de um grupo de quatro outros pastores, que foram os que o demitiram e disciplinaram. Isso fez bem para ele. E faria muito bem a líderes evangélicos que fundaram suas próprias igrejas e denominações, que são seus próprios patrões e não respondem a ninguém pelo uso do dinheiro dos fiéis, sua vida pessoal e sua conduta como líder. Somente quanto vira caso de polícia e de justiça é que eles são chamados a responder por seus atos.

2) Subiu o nível de alerta entre os pastores que realmente temem a Deus. "Aquele que está em pé, veja que não caia" (1Co 10.13). Espero que tenha aumentado a convicção de que o pecado penetrou e corrompeu mais profundamente a alma humana do que até mesmo a nossa doutrina da depravação total reconhece. "Em mim não habita bem algum" (Romanos 7).

3) Subiu a consciência da seriedade da luta que travamos diariamente contra o pecado. Eu acredito na confissão que Haggard fez. Acredito no que ele disse, que lutou a vida toda contra a impureza, a tentação, a luxúria, a lascívia, e que ganhou algumas vezes e perdeu outras. Ao contrário de outros líderes evangélicos – inclusive no Brasil – que ao serem apanhados nunca realmente confessaram nem assumiram sua inteira culpa, Haggard fez isso. Acredito no que ele disse: que todas as coisas erradas que ele fez são contrárias ao que ele (ainda) acredita e pregou sua vida toda. Acredito que uma pessoa pode passar a vida inteira numa luta encarniçada contra hábitos pecaminosos e finalmente cair vencida no campo de batalha, após perder a sua lucidez, seu bom-senso e a própria razão. Pode acontecer – na verdade, está acontecendo hoje, agora – com muitos pastores e líderes, uma guerra secreta contra o pecado que eles aborrecem. O nível de alerta subiu. O caso Haggard mostra onde tudo pode terminar. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.
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quinta-feira, novembro 02, 2006

Solano Portela

Lidando com o Caos – Que tal um pouco de história?

Observo perplexo os acontecimentos do início deste mês de novembro de 2006, que coincidem com a continuidade de um governo que empolga e se elege, mas que há muito considera secundária a tarefa de fazer o que deve ser feito, controlar o que deve ser controlado, governar o que deve ser governado e administrar o que deve ser administrado.


Minha perplexidade não diz respeito às comemorações da reeleição, ou ao pronunciamento do candidato eleito, levado ao ar de forma compulsória, mas à “greve branca” dos controladores de tráfego aéreo. Estes foram repentinamente acometidos de um senso de precaução e segurança que esteve ausente durante anos de atividades e deixaram, quem sabe seguindo o exemplo do líder máximo, de fazer o que deveriam estar fazendo. Lançando literalmente no espaço a já inexistente ética brasileira, decidiram complicar a vida de milhares de cidadãos viajantes que pagam impostos e têm tarefas a realizar, ou outros que, simplesmente, pensavam que podiam viajar com suas famílias. Fazendo “corpo mole”, jogaram os aeroportos da nação no caos, impedindo não somente o direito de ir e vir das pessoas, mas também o direito delas receberem os serviços pelos quais pagaram.

E as autoridades? Ah, as nossas autoridades – quão pitorescas e fora de foco! Inicialmente afirmaram que estava tudo normal, que não existia nenhum problema, mesmo perante a evidência gritante dos atrasos absurdos e com os telejornais já mostrando discussões intensas nos balcões das empresas aéreas – aliás, negar evidências parece ser uma postura institucional, ultimamente.

Com o caos já instalado, o Ministro da Defesa dá uma entrevista, nesta noite, jogando a culpa na aeronáutica que deixou de lhe informar sobre a gravidade da situação – parece que entregar “os companheiros” já é, também, uma norma institucionalizada. É interessante verificar que ele também “não sabia”.

Mais tragicômico, foi o Jornal Nacional da Globo transmitir diretamente da “Sala de Crises” da ANAC – uma minúscula sala de reuniões onde vários militares obesos bem intencionados examinavam mapas de rotas aéreas, pregados nas paredes, que mais pareciam documentos históricos recuperados. Ao redor da mesa, outros, faziam projeções dos vôos em notebooks arcaicos e surrados de 7 kg. e, pasmem, comunicavam-se via celulares com aeroportos e torres de controle do país. Assim estão sendo definidas as rotas e os destinos de centenas de vôos diários e de suas preciosas cargas de vidas, em nosso país. Qualquer semelhança com outras eletronicamente bem aparelhadas “salas de crise” que vemos por aí, não será nunca encontrada.

Nesse meio tempo, o líder dos grevistas faz uma reunião cordial, em Brasília, certamente regada a bastante cafezinho, sucos e salgadinhos, na qual discutiram uma mudança de subordinação – querem se desligar da esfera militar e ser supervisionados por civis. Nem sei por que – a atual forma parece bem amena e não incomoda a intrigante e não tão criativa tarefa de lançar a nação no caos (os sem-terra já são mestres nisso há bastante tempo).

Enquanto isso, o que faz o nosso sindicalista que ocupa por algumas horas por semana a Palácio da Alvorada? Entra em seu avião particular e milagrosamente imune aos atrasos, noites mal dormidas e prejuízos que estão afetando milhares de meros mortais brasileiros, vai tirar alguns dias de férias na Bahia, que ninguém é de ferro.

Como lidar com o caos? Os nossos líderes deveriam estudar um pouco a história, verificando o que outros mais lúcidos fizeram em situações semelhantes. Se tivessem ânimo à pesquisa e à leitura, nem precisariam retroagir tão longe assim, para extrair algumas lições.

Em 1981, mais precisamente no início do mês de agosto, os controladores de vôo dos Estados Unidos começaram uma greve gigante no país. O sindicato deles (PATCO) agregava mais de 17 mil associados e desses, 13 mil paralisaram suas atividades exigindo melhores salários, apesar da atividade ter uma remuneração substancialmente acima da média. Interromperam, assim, negociações que já se estendiam por seis meses, nas quais haviam obtido várias vantagens e aumentos. Desde 1955 que greves em atividades essenciais eram proibidas por lei, nos Estados Unidos, no entanto mais de 22 paralisações ilegais haviam ocorrido nos anos recentes em diversas atividades similares. O que fez o presidente Ronald Reagan? Foi tirar férias na Flórida? Jogou a culpa no Ministro da Aeronáutica? Disse que “não sabia” que a situação era tão grave assim? Não! Vejam as lições, em como lidar com o caos, evidentes em algumas das medidas e decisões tomadas:


  • Primeiro, com precaução e planos emergenciais: Durante as negociações – nos seis meses anteriores, a FAA (Federal Aviation Administration) arquitetou um plano de emergência que previa a possibilidade de paralisação: 3000 supervisores, junto com os que não aderiram a greve colocaram a “mão na massa”, passando a controlar o tráfego aéreo; 900 militares da aeronáutica se uniram a eles. Essas pessoas não se furtaram, na emergência, a trabalhar 60 horas por semana – o dobro do que atualmente trabalham os nossos controladores. Para surpresa de todos, principalmente dos grevistas, o plano funcionou tranquilamente. Que contraste com a ignorância das nossas autoridades, que "não sabiam" o estado real desse segmento.
  • Segundo, com coragem e objetividade: Reagan deu 48 horas para que eles retornassem ao trabalho sob pena de serem sumariamente demitidos. Obviamente não faltaram os profetas da catástrofe que aventavam desastres enormes, que não ocorreram, com a suposta “falta de segurança” presente no plano e nas ações do governo. Que contraste com a condecendência do nosso governo para com os perturbadores da ordem.
  • Terceiro, com ações de porte e eficácia: Grande parte dos grevistas achou que o governo blefava, não voltou ao trabalho e foi para a rua da amargura. Os cursos que preparavam controladores de vôo, que formavam 1.500 a cada 21 semanas, aumentaram as classes, a capacidade e encurtaram o período para 17 semanas, passando a formar 5.500 controladores, no período. Dentro de poucas semanas a “fila” de candidatos a essas vagas chegou a 45.000 pessoas. Que contraste com o pronunciamento do nosso Ministro da Defesa, informando que contratarão 60 pessoas adicionais.
  • Quarto, com a aplicação rápida da lei: Os líderes do movimento foram presos por incitar e promover uma greve ilegal e processados em toda a extensão da lei. O sindicato foi multado em um milhão de dólares por dia de greve. O apoio popular foi todo para o governo, em vez de para os grevistas. Em 1984 o tráfego aéreo havia aumentado 20% e era eficientemente controlado por uma força de trabalho que era 80% daquela existente antes da greve de 1981. Que contraste com a impunidade que reina em nossa terra.
É desnecessário frisar que a forma como Reagan lidou com esse incidente restabeleceu o respeito ao governo, que vinha tratando a quebra da lei e da ordem de forma displicente, em administrações anteriores, e deu o tom aos anos que se seguiriam. Qualquer semelhança com o tratamento que as nossas autoridades vêm dando à greve do Pindorama é inexistente. Estamos realmente falidos na administração das questões públicas que afetam o dia-a-dia de grandes segmentos da população. Enquanto o governo se ocupa de tudo que é trivial, se esquece daquilo que é essencial. Daí a necessidade de estarmos alertas exercitando nossa cidadania na fiscalização de quem está la e na lembrança de caminhos viáveis aos impasses sociais. Podemos estar desanimados e tristes, sim; mas não desfalecidos!

Solano Portela

Os interessados no incidente relatado acima, ocorrido em 1981, podem obter mais detalhes clicando aqui.
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