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Educação - Qual o diagnóstico que você faz da educação básica no Brasil? Quais os principais problemas, avanços e retrocessos que a educação vive?
Analisando friamente os números, a educação básica vive, nos últimos sete anos, um período de retração. Por exemplo, no ensino fundamental (1ª a 8ª série), a rede pública, gratuita, mantém a quantidade de alunos (32 milhões - MEC-Inep), enquanto a rede particular tem progressivamente encolhido (15%). Isso ocorreu exatamente quando houve ampliação da capacidade nas escolas. As escolas sentem diretamente o reflexo do empobrecimento geral da classe média e da decrescente taxa de natalidade dos últimos anos. A escola particular, pressionada financeiramente pelo descompasso entre investimento e recrutamento, tem a tendência de sacrificar a qualidade de ensino exatamente quando os indicadores internacionais mostram a necessidade de elevarmos qualitativamente o nível dos nossos alunos.
Na formação dos professores, atravessamos décadas de um ensino meio utópico e idealista, no qual a ênfase na liberdade de quaisquer diretrizes, a concentração quase exclusiva no método e a retirada do mérito, como incentivo e forma de aferição, diluíram consideravelmente a qualidade do ensino. Os alunos deixaram de ser preparados para o mundo real, competitivo, no qual importa, sim, o que você sabe. Conteúdo virou termo pejorativo nos círculos pedagógicos. Atravessamos uma situação semelhante à descrita por um educador norte-americano (J. Gresham Machen) quando, comentando sobre a ênfase desmedida no método sem a importância necessária ao conteúdo, escreveu: "Fizemos uma grande descoberta pedagógica - que é possível pensar com uma mente completamente vazia!" Felizmente, parece que décadas de resultados desastrosos começam a acordar os nossos educadores, que passam a dar mais importância a valores, princípios, diretrizes, disciplina e, também, conteúdo - sem descartar ou negligenciar as melhores metodologias.
Educação - Quais foram as grandes mudanças pelas quais o ensino passou nos últimos tempos? O que é necessário para ser um bom colégio atualmente?
Com certeza a grande mudança metodológica é na tecnologia de informação. Hoje não se pode conceber o ensino que não utilize o computador com a tranqüilidade e facilidade com que papel e lápis têm sido utilizados.
Na área social, observamos o enfraquecimento da esfera da família. Isso tem profundos reflexos no conceito da escola, que passa a ter de trabalhar situações que antes eram abrigadas no seio familiar. Em paralelo, observamos conseqüentes tentativas de transferência de responsabilidades da família para a escola, forçando uma redefinição das áreas e dos limites. Por incrível que pareça, o colégio vê-se, freqüentemente, na qualidade de instrutor dos pais.
Para ser um bom colégio, atualmente, o ensino encontrado nele deve ser firmado em valores e princípios, de tal forma que esse ambiente e contexto permeie todas as disciplinas. A sociedade está cansada de uma educação amorfa e permissiva. Existe um anseio pelos valores de uma tradição bem firmada que dê aos alunos igual ênfase à modernidade e à visão do futuro. Não podemos simplesmente educar para o presente (e muito menos para o passado). Os colégios precisam equipar os alunos para que enfrentem os desafios do futuro com pleno conhecimento e habilidades que se enquadrem na época em que viverão a qual ainda não foi atravessada. Em um bom colégio, portanto, tanto a escola como as professoras e os professores têm que ser um pouco visionários. Não podem ser refratários a métodos contemporâneos à ampla utilização da informática. Devem dominar e equipar seus alunos a controlar o fluxo desmedido de informação no qual estão submersos.
Na esfera moral, esse controle, obviamente, parte pela adoção de valores éticos, principalmente porque vivemos em uma era onde é incentivada a sexualidade precoce e onde se jogam as crianças e os adolescentes em interações para as quais não possuem ainda a necessária maturidade. Em vez de policiamento ostensivo, o colégio deve promover, sobretudo, o desenvolvimento de autocontrole, considerando que as portas de acesso de idéias destrutivas e contaminadoras do progresso pessoal e de uma vida responsável estão escancaradas no lar, na rua e na escola. Perdemos o progresso suave que ia da inocência à maturidade responsável e temos de resgatar esses estágios, possibilitando que crianças sejam crianças e não adultos prematuros, maldosos e cheios de segundas intenções, sob a cobertura de uma falsa e enganosa "liberdade de expressão". Programas governamentais que incentivam promiscuidade, sob a falsa capa de transmissão de informações sexuais, devem ser veementemente resistidos e denunciados.
A escola que se rende à dissolução moral, adotando a linguagem e os métodos rasteiros da sociedade, com o argumento de que é assim mesmo e não se consegue mudar, é assumir a falência do sistema educacional e se entregar à derrota, como pedagogos. Os educadores devem se empenhar a fundo em uma reorientação da forma de educar e no fornecimento de ferramentas comportamentais e de controles aos jovens colocados sob seus cuidados. Isso não é possível sem âncoras metafísicas de valores e princípios; sem um fio de prumo que mostre se o edifício que se pretende erguer caminha para o desastre final, por terem sido utilizados materiais duvidosos, construção inadequada e métodos falhos.
Educação - Quais são os grandes desafios atuais para um bom professor? Que concepções mudaram em relação ao professor do passado?
Já está sedimentado que o professor discursivo não é eficiente, mas demos uma guinada demasiada encorajando professores passivos. A autonomia desmedida nas salas de aula, a quebra da autoridade do professor, a falta de respaldo ao respeito devido nas salas de aula são elementos prejudiciais a uma boa educação e à dignidade da profissão.
O grande desafio é, portanto, o professor ser produtivamente interativo, metodologicamente atualizado, informaticamente alfabetizado e que faça parte de uma escola que tenha filosofias e valores definidos, os quais abrace e defenda e com os quais comungue.
3 comentários
comentáriosCaro Professor Solano
ResponderExcelentes idéias e uma visão madura da educação.
Faço apenas um suspense sobre a frase... "Já está sedimentado que o professor discursivo não é eficiente."...
Não sei se é bem assim.
Acho que depende...
Depende do aluno, depende do professor, depende da matéria, e depende da circunstância.
Eu pessoalmente sempre aprendi mais com professores discursivos.
Leio aqui professores discursivos como aqueles que usam do discurso para lecionar. Se tiver outro significado me perdoe.
O fim da aula discursiva para mim foi como se algum dia hipotético, o pregador saia do púlpito abrindo mão do seu sermão-discurso e me diga, "agora vocês vão se reunir em grupo, ler este material, e construir por si só aquilo que vocês querem que Deus vos fale ao coração...". Não seria de se espantar que depois de um tempo, o pregador perderia a autoridade e a fala autorizada.
Eu detestaria pois gosto do discurso, dos bons discursos.
Penso que a falência do professor discursivo se deu muito mais aos números altos demandados por professores, e a falta de bons professores naturalmente propensos a uma aula expositiva.
Assim foi necessário a busca de outros métodos, porque entre uma aula expositiva de quem não sabe fazê-la, e outra coisa, de fato é preferível outra coisa qualquer.
Caso eu tenha falado bobagem, favor ignorar e perdoar.
Realmente gostei das suas idéias.
Um grande abraço
Caro Oliveira:
ResponderObrigado por seu comentário. Note que eu defendo bastante o conteúdo e a substância, acima da forma.
Eu quero dizer que o professor não deveria ser simplesmente discursivo. Não é impossível se aprender com esse tipo de professor, mas certamente não é a melhor metodologia. Alguns alunos absorvem bem, assim, mas não a maioria.
Mesmo os "discursivos" clássicos, eram sempre considerados bons professores quando utilizavam ilustrações em profusão ou provocavam a interatividade da classe. Hoje, com toda a tecnologia, existem muitas ferramentas de interatividade.
Note, também, como é que Jesus ensinava. Era "hands on", com aulas práticas, de campo e com o estímulo às pesquisas.
Após dar o conteúdo (com frequência ilustrado com parábolas que tinham propósito duplo, é verdade, mas um deles era ilustar), ele os mandava dois a dois.
Veja o incidente da Mulher Samaritana. Jesus não "discursa", simplesmente. Ele ganha a confiança, atiça a curiosidade, toca a consciência e insere conteúdo - mas com plena interatividade. A forma como ele ensina faz com que ela despeje um monte de perguntas, nesse intenso diálogo - e isso é o sonho de todo bom professor. Quantas vezes um professor não se encontra frustrado, na frente de uma classe apática, que não verbaliza a inexistência de ensino, e não responde à pergunta: "há alguma dúvida ou comentário"?
Acho que a defesa não deve nos levar a sermos descuidados quanto à melhor metodologia, mas temos de cuidar para que métodos não sufoquem o conteúdo; nem devemos comprar como "um método" uma filosofia educacional que é falha em suas premissas.
Um abraço e, mais uma vez, obrigado.
Solano
Solano, gostei muito de sua entrevista, peço ao nosso Senhor que lhe dê condições para ampliar sua capacidade de enxergar esse espectro de nossa sociedade.
ResponderDeus continue contigo!
Luís - Mgá/PR