terça-feira, janeiro 31, 2012

Augustus Nicodemus Lopes

Apostasia, Nova Ordem Mundial e Governança Global

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Tive o privilégio de escrever um dos capítulos deste livro. Ele será lançado no encontro da VINAAC em Campina Grande, durante o período do Carnaval. Vejam a relação dos capítulos e autores:
  • O ANTICRISTO E O ESPÍRITO DO ANTICRISTO - Russell Shedd 
  • O PENSAMENTO ESCATOLÓGICO NA IGREJA CRISTÃ: Implicações do uso e da negligência da Escatologia na Vida da Igreja - Robson Fernandes
  • A APOSTASIA NA IGREJA NO CONTEXTO MUNDIAL - Augustus Nicodemus
  • UMA RESPOSTA AO DESCONSTRUCIONISMO FILOSÓFICO - Norman Geisler
  • UMA RESPOSTA AO DESCONSTRUCIONISMO TEOLÓGICO - Norman Geisler
  • A NOVA MORALIDADE: A imposição mundial do pensamento politicamente correto - Norma Braga 
  • APOSTASIA, NOVA ORDEM MUNDIAL E GOVERNANÇA GLOBAL: A Ordem Político-Jurídica Internacional - Uziel Santana
Ele pode também ser adquirido online.


O livro foi organizado pelo Prof. Uziel Santana. Espero que ajude a Igreja de Cristo a entender o momento que estamos vivendo.
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terça-feira, janeiro 24, 2012

Augustus Nicodemus Lopes

Decepcionados com ordenação de homossexuais, presbiterianos deixam a denominação (PCUSA) em massa

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Foto da reunião
Como todos sabem, no ano de 2011 a PCUSA (Presbyterian Church of the United States) tomou a decisão em sua Assembléia Geral de aceitar como pastores e pastoras da denominação gays e lésbicas praticantes. Nós já havíamos tratado deste assunto aqui no blog, anunciando que uma divisão na PCUSA estava prestes a acontecer.

Os presbiterianos daquela denominação que não aceitaram esta decisão e que também estavam já preocupados com outros rumos desta denominação marcaram uma reunião para janeiro deste ano (2012), que aconteceu em Orlando, na Flórida. Havia cerca de 2100 participantes inscritos presentes representando cerca de 500 congregações da PCUSA. Lembremos que há aproximadamente 11.000 igrejas da PCUSA nos Estados Unidos.

Na reunião ficou decidida a fundação de uma nova entidade reformada, que será chamada “The Evangelical Covenant Order of Presbyterians” (“A Ordem Pactual Evangélica de Presbiterianos”), abreviada como ECO. Os detalhes ainda estão sendo trabalhados, mas provavelmente esta “Ordem” deverá funcionar como uma nova denominação, embora este ponto ainda não esteja claro.

Foi distribuída uma lista com os “valores” teológicos e pastorais da ECO:
  • Identidade moldada por Jesus (em que a questão essencial é se a pessoa é realmente um discípulo de Jesus);
  • Integridade bíblica (em que a questão essencial é saber se as Escrituras, única Palavra de Deus e que tem autoridade absoluta, realmente define a nossa identidade);
  • Teologia Reflexiva (em que a educação teológica reformada é estimada);
  • Comunidade responsável (em que as igrejas são comunidades onde a orientação é realmente uma experiência corporativa espiritual);
  • Ministério igualitário (em que os dons espirituais de ambos os sexos e de todos os grupos raciais e étnicos são “desencadeados”);
  • Centralidade missional (em que a Igreja “vive” a toda a Grande Comissão “, incluindo a evangelização, formação espiritual, compaixão e justiça redentora”)
  • Espiritualidade focada no centro (em que a Igreja chama as pessoas para o núcleo do que significa seguir a Jesus e “não se fixa sobre os limites”)
  • Liderança rápida (em que a Igreja identifica e desenvolve os líderes que são dispostos a assumir riscos, inovadores e orgânicos);
  • Vitalidade do Reino (pelo qual a igreja reproduz ativamente comunidades missionais).
Pastor e Pastora liderando a reunião
Já foram redigidos os documentos principais da futura enteidade e foram apresentados na reunião - um projeto dos compromissos teológicos do grupo e um outro com o projeto de estatuto da nova instituição.

Bom, na minha avaliação este novo corpo eclesiástico - denominação ou coisa parecida - será maior do que as duas principais denominações presbiterianas nos Estados Unidos que são conservadoras, a saber, a PCA (Presbyterian Church of America) e a EPC (Evangelical Presbyterian Church), embora ainda menor do que a PCUSA.

Fiquei feliz por ver que ainda há crentes verdadeiros e que amam a Palavra de Deus dentro de uma denominação que vem apostatando da verdade há muitos anos. Espero sinceramente que os que resolveram ficar na PCUSA e continuar a luta consigam, quem sabe, um dia retomar a histórica denominação para os caminhos do Evangelho de Cristo.

Dá para ver pela relação de valores acima que este novo grupo pretende realmente ser reformado, bíblico e conservador. Todavia, revendo a lista uma coisa me preocupa, que é o ítem chamado de "ministério igualitário". Trocado em miúdos, este item significa que a nova organização não somente aceitará como encorajará a ordenação de pastoras e presbíteras, como faziam na PCUSA de onde saíram. Algo similar ao fato de que Lutero, ao sair da Igreja Católica, manteve por um tempo determinadas idéias romanas. Aguardemos que da mesma forma que Lutero livrou-se deste ranço católico com o tempo, que os novos presbiterianos também tenham coragem para fazer a reforma completa e abolir a ordenação feminina.

Eles deveriam ser os primeiros a saber que foi a ordenação feminina quem abriu a porta para a ordenação de homossexuais na denominação deles. Tudo começou quando a PCUSA passou a tolerar que o liberalismo teológico fosse ensinado nas suas instituições teológicas, as quais são responsáveis pela formação teológica, eclesiástica e ministerial dos seus pastores. O liberalismo teológico retira toda a autoridade das Escrituras como palavra de Deus, introduz o conceito de que ela é fruto do pensamento ultrapassado de gerações antigas e que traz valores e conceitos que não podem mais ser aceitos pelo homem moderno. Assim, coloca a Bíblia debaixo da crítica cultural. O passo seguinte foi a aprovação da ordenação de mulheres cristãs ao ministério, em meados da década de 60, com base exatamente no argumento de que os textos bíblicos que impõem restrições ao exercício da autoridade eclesiástica por parte da mulher cristã eram culturalmente condicionados, e portanto impróprios para a nossa época, em que a mulher já galgou todas as posições de autoridade.

O argumento que vem sendo usado há décadas pelos defensores do homossexualismo dentro da PCUSA segue na mesma linha. Os textos bíblicos contrários ao homossexualismo são vistos como resultantes da cosmovisão cultural ultrapassada dos escritores bíblicos, refletindo os valores daquela época. Em especial, os textos de Paulo contra o homossexualismo (Romanos 1 em particular) são entendidos como condicionados pelos preconceitos da cultura antiga e pela falta de conhecimento científico, que segundo os defensores do homossexualismo hoje já demonstra que ser gay é genético, não podendo, portanto, ser mais considerado como desvio moral ou pecado. Já que a cultura moderna mais e mais aceita o homossexualismo como normal, chegando mesmo a reconhecer o casamento entre eles em alguns casos, por que a Igreja, que deveria sempre dar o primeiro exemplo em tolerância, aceitação e amor, não pode receber os homossexuais como membros comungantes e pastores da Igreja? Essa foi a argumentação que finalmente prevaleceu, pois a decisão permite que homossexuais praticantes considerem a sua escolha sexual como uma questão secundária e não como matéria de fé, sujeita à disciplina eclesiástica da denominação.

Infelizmente, uma das lições que se aprende com a história é que poucos aprendem alguma coisa com ela. Vamos esperar que este seja um destes casos...
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quarta-feira, janeiro 18, 2012

Augustus Nicodemus Lopes

Conselhos a Um Pregador Itinerante

Por     14 comentários:
[carta dirigida a personagem fictícia, porém baseada em experiências e fatos bem reais]

Meu caro Pr. Filipe,

Obrigado por seu e-mail contando as experiências recentes em suas pregações Brasil afora. Eu mesmo tenho tido a oportunidade, durante meu ministério, de pregar praticamente em todos os Estados da Federação e em vários países do exterior. Só posso agradecer a Deus.

Acho que é por isso que me sinto à vontade para atender seu pedido de conselhos práticos para suas viagens. Vou falar de coisinhas práticas que, mesmo sendo pequenas e “mundanas”, podem estragar sua estada em uma igreja.

1. Se for viajar de avião, acerte bem cedo quem vai comprar a passagem. Já me aconteceu de chegar o dia de viajar e não ter um bilhete. Os que me convidaram não compraram passagem pensando que eu ia comprar! Foi uma dificuldade conseguir passagem de última hora e estas geralmente são mais caras.

2. Se ficar a seu critério comprar a passagem, veja o horário em que a programação começa, para não chegar em cima da hora. Dê sempre um espaço para atrasos nos aeroportos. Peça um assento no corredor ou janela, não deixe para marcar na hora do embarque. Você pode terminar lá no fundo, espremido entre dois gordões durante duas horas de vôo. Um verdadeiro inferno.

3. No caso de você comprar a passagem, guarde o comprovante para mostrar quanto custou, na hora do reembolso. Não será um problema se você não tiver comprovante, mas fica mais elegante e transparente estar pronto para mostrá-lo.

4. Escreva em lugar acessível um telefone para contato, e mesmo o endereço da Igreja ou do local das pregações, para quando chegar ao aeroporto da cidade onde vai pregar não ser surpreendido por um aeroporto vazio, sem ninguém lhe esperando. Já passei por isso, sem telefone de contato e sem endereço, e lhe garanto, é desesperador!

5. A bagagem é extremamente importante, em caso de compromissos fora da sua cidade. Se for de ônibus, tudo bem. Se for de avião, esteja preparado para extravios. A melhor coisa é viajar leve e acomodar suas roupas, etc. em uma mala ou bolsa que você possa levar consigo dentro do avião, sem ter que despachar como bagagem. Se não tiver jeito, leve pelo menos uma muda de roupa com você. As chances de extravio de bagagem são grandes. Já me ocorreu de chegar em Goiânia para pregar num grande evento, e minha mala se extraviou. Tive que morrer num Shopping Center para comprar de última hora uma roupa completa e todos os acessórios (por causa do meu tamanho, sempre é difícil conseguir paletó emprestado...). A mala só apareceu dois dias depois.

6. Ainda sobre bagagem. O costume das igrejas varia muito pelo Brasil quanto à indumentária do pregador. Em alguns lugares, usar paletó é sagrado. Em outras, indiferente. Meu conselho é que pergunte antes ao pastor da Igreja que indumentária ele costuma usar. E caso isso não tenha sido possível, leve um paletó completo por via das dúvidas. Esteja preparado para tudo – rasgar as calças, descosturar o zíper da calça do único paletó (isso me ocorreu na encantadora Porto Velho. Minha sorte foi que havia uma irmã que era excelente costureira e deu um jeito a tempo para o culto da noite), manchar o único paletó que levou logo na primeira refeição, etc.

7. Por falar em hospedagem, naqueles compromissos de mais de um dia, meu conselho é que não imponha como condição ficar num hotel. Pega muito mal. Infelizmente, muitos pregadores evangélicos de renome quando aceitam um convite impõem como condição, além da oferta já determinada, ficar em hotéis de várias estrelas, comer em determinados locais, etc. etc. Para mim, é coisa de mercenário. Diga que aceita ficar hospedado na casa de uma família desde que você tenha tempo para descansar e rever seus sermões e orar. No meu caso, eu acrescento que não consigo dormir com mosquito (pernilongo, muriçoca, etc. – você tem que lembrar que dependendo do lugar para onde vai, o nome muda...) e calor, e se a família tiver pelo menos um bom ventilador e repelente, já basta. Deixe a Igreja que lhe convida decidir onde vai lhe hospedar. (Se você quiser ler um pouco sobre as bençãos de ser hospedado – e dos que hospedam pregadores – leia uma série de posts sobre o assunto, que começa aqui.

8. Como você é presbiteriano, fique atento para um detalhe que pode acabar trazendo algum embaraço, se você for convidado para pregar numa igreja batista. Isso nunca me aconteceu, mas sei de casos em que o pastor presbiteriano foi pregar numa igreja batista e na hora da Ceia do Senhor foi preterido – o diácono zeloso não lhe serviu o pão e o vinho (como eram batistas, provavelmente era suco de uva). Ouvi falar de pastores presbiterianos que passaram por esse vexame e sei de pelo menos um que se levantou e saiu do culto, na hora. Não precisava tanto, talvez. Mas, que fica chato, fica. Você é crente o suficiente para estar falando lá e até para ensinar a congregação como trilhar os caminhos de Deus, mas não para tomar ceia...Por isso, cuidadosamente, pergunte antes ao colega batista, ou de outra denominação que restrinja a Ceia, se haverá celebração da Ceia e se ele tem a posição restrita ou mais aberta, que concede a Ceia aos pobres presbiterianos. O que é acertado antes, não sai caro.

9. Outro conselho – procure informar-se ao máximo da Igreja onde vai pregar, ou dos que estão patrocinando o evento em que você vai falar. Em 1997 paguei um dos maiores micos do meu ministério quando fui convidado para falar sobre Batalha Espiritual em uma igreja presbiteriana fora de São Paulo (eu tinha acabado de lançar meu livro O Que você Precisa Saber sobre Batalha Espiritual). Eles esperavam que eu falasse a favor e eu fui falar contra! Se eu tivesse tomado o cuidado de me informar cuidadosamente das posições do pastor da época e da situação da igreja, provavelmente teria recusado o convite ou então deixado muito claro que iria falar contra. Foram três dias de tensão e desconforto, na esperança de que Deus estivesse utilizando positivamente aquele constrangimento... Conhecer antecipadamente sua audiência vai ajudar a calibrar a pregação, determinar os conteúdos e tirar do baú do escriba coisas velhas e novas apropriadas para a ocasião (Mateus 13.52).

10. Nesse sentido, é bom estar absolutamente seguro da ocasião e do motivo do convite. O que a Igreja espera? É um aniversário da Igreja? Há um tema específico? Os temas das pregações ou palestras são livres? Eles esperam que você fale quantas vezes? Seja organizado, tenha tudo isso anotadinho bem antes do evento. Eu já passei por maus momentos por causa de desorganização. Cheguei na cidade onde tinha de pregar três vezes sem ter me assegurado da ocasião. Confesso que confiei demais na minha experiência e nos sermões de reserva que tenho de memória. A ocasião era o aniversário do coral da UPH!!! Eu não tinha sermão nenhum preparado para isso. Tive de improvisar na última hora e ficou aquela beleza...

11. Ainda alguns conselhos sobre as pregações. Pergunte antes o tempo que o pastor da igreja costuma pregar. Não abuse do fato que você é convidado. Você vai querer que eles se lembrem de você como “ah, aquele pastor que pregou tão bem sobre Lázaro...” e não como “ah, sim, aquele pastor que pregou cada sermão um mais comprido que o outro...”

12. Outro conselho muito importante. Pregadores itinerantes “como nós” costumam ter um pacote de sermões que levamos conosco e pregamos onde somos convidados. Pode acontecer o desastre de você repetir o mesmo sermão num mesmo lugar. Já passei por essa vergonha. Quem me salvou foi Solano Portela, que estava presente, e logo que eu anunciei o texto e fiz a introdução do sermão, ele discretamente se levantou do banco e me passou um bilhetinho onde estava escrito “você já pregou esse sermão aqui no mês passado”. Quase morri de vergonha. E o pior foi pregar na hora um sermão novo de improviso! Portanto, ache um jeito de registrar onde você pregou determinado sermão e quando, para evitar esse desastre.

13. Por incrível que pareça, o púlpito onde você vai pregar pode se tornar um problema. Há igrejas com púlpitos minúsculos e outras que nem púlpito têm mais – foram aposentados quando o pastor e a igreja adotaram grupo de coreografia, um enorme grupo de louvor e equipe de teatro. O pastor passou a pregar com microfone sem fio, andando pelo palco e pela igreja, sem anotações e sem a Bíblia diante dele, só contando histórias e experiências. Eu sei que você gosta de pregar expositivamente, de ter sua Bíblia aberta diante de você e as anotações ao lado. O que fazer em casos assim? Eu já me virei com aquele estande do regente do conjunto coral, onde de improviso acomodei a Bíblia e as notas. Em outras vezes, não teve jeito. Tive de pregar com a Bíblia aberta numa mão e o microfone sem fio na outra, sem chance de ter as anotações! Nesse caso, o que me salvou foi a boa memória a experiência de pregar de improviso. Meu conselho é que você também pergunte ao pastor se haverá ao menos um estande de regente para colocar Bíblia e notas. Outro conselho é que memorize os sermões e passe a pregar sem notas. Isso vai lhe salvar de inúmeras situações similares.

14. Agora, a questão da oferta. Na verdade, isso não deveria ser nem mesmo uma questão para você. No máximo é uma questão apropriada para quem convida. Quando isso passa ser o foco do seu ministério, vira coisa de mercenários, os que mercadejam a Palavra de Deus. Sei que existem muitos que não têm outras fontes de sustento a não ser o ministério itinerante, mas não é o seu caso e eu não saberia como lidar com essa situação... Já recebi vários convites que vinham com a pergunta receosa, “quanto o irmão cobra por palestra?” Obviamente, respondi que não cobro absolutamente nada, só preciso que paguem as despesas de passagem e hospedagem. Já houve casos em que acabei pagando para ir pregar em outro Estado, numa igrejinha que não tinha condições de pagar a passagem de avião. De ônibus, levaria 2 dias para ir e mais 2 dias para voltar (Deve ser por isso que minha agenda de pregações vive lotada...). Meu conselho é que não conte com ofertas, como se fosse coisa certa. Não são. São um extra, um bônus, que pode ter ou não. Se, todavia, a igreja ou entidade patrocinadora lhe oferecer uma oferta, aceite com alegria e gratidão. Se recusar, vai ofendê-los.

Bom, eu teria mais um monte de coisas para dizer sobre esse assunto. Afinal, após 30 anos como pregador itinerante, no Brasil e fora dele, a gente aprende muito. Mas, no geral, eu lhe diria que tem sido um grande privilégio e alegria pregar em tantos lugares diferentes. Os contratempos não representam nada diante das bênçãos. É claro que isso só tem sido possível pela compreensão e apoio da minha esposa (filha de missionários) e de nossos quatro filhos... recentemente fiquei muito alegre quando uma igreja mandou uma carta para minha esposa e filhos, agradecendo por terem me liberado para passar um fim de semana com eles.

Um grande abraço!
Augustus
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quinta-feira, janeiro 12, 2012

Augustus Nicodemus Lopes

Uma Análise dos Evangélicos Hoje - Entrevista a Revista Eclésia

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Trancrevo aqui entrevista concedida à revista Eclésia e que foi publicada neste último número. É uma entrevista bem extensa que abordou muitos e variados assuntos. Acredito que reflete de maneira justa a realidade das igrejas evangélicas no Brasil hoje.

ECLÉSIA: Ateus são aqueles que não crêem em Deus. De que maneira pode existir um “ateísmo cristão”, justamente o título de seu último livro?
O apóstolo Paulo se refere àqueles que professam conhecer a Deus e que,  entretanto, o negam por suas obras (Tito 1:16). Chamo de ateísmo cristão a negação de que Deus interfere, age e atua na realidade humana, negação esta feita por pessoas que se professam cristãs e que argumentam usando a terminologia cristã. Na verdade, isto nada mais é que o antigo deísmo, a idéia de que Deus existe mas que não interfere na realidade humana. O deísmo foi a religião dos antigos liberais e continua, ligeiramente modificada, sendo a teologia dos novos liberais. Para mim, admitir a existência de Deus mas negar sua presença na história e na experiência humana é a mesma coisa, ao final, que o ateísmo – só que com capa de cristianismo.

ECLÉSIA: Há quem acredite que o Brasil esteja experimentando um avivamento por causa do crescimento dos evangélicos. Mas o senhor diz que a Igreja sofre sérias ameaças. Isso não é uma contradição?

No meu caso não é uma contradição porque eu nunca afirmei que o Brasil está experimentando um avivamento espiritual. O que constato é o crescimento nas duas últimas décadas das seitas neopentecostais, que a mídia costuma confundir com os evangélicos. Eu sei que há pessoas que são verdadeiramente crentes no Senhor Jesus nesse meio, em que pesem os ensinamentos e práticas estranhos ao Evangelho. Todavia, isto não diminui a ameaça que o movimento representa para a igreja cristã.

ECLÉSIA: Ainda falando sobre o crescimento evangélico, o segmento mais conhecido hoje é neopentecostal. E, talvez pelo aparente sucesso, talvez pelo poder midiático, tem influenciado com práticas e estilos de culto denominações pentecostais e históricas. Esse processo não é irreversível?
Não sei se é irreversível. Este crescimento vem diminuindo nos últimos anos, pois a proposta das igrejas neopentecostais não se sustenta por muito tempo. Cedo ou tarde as promessas da teologia da prosperidade se mostram vazias, gerando uma multidão de decepcionados que vão engordar as fileiras dos desigrejados. Percebe-se, também, a crescente separação e distanciamento destes movimentos neopentecostais do pentecostalismo clássico e das igrejas históricas, o que é muito bom, pois deixa a diferença entre nós e eles mais clara. Infelizmente, a influência das práticas neopentecostais nas igrejas históricas tem feito e continuará a fazer, por algum tempo, considerável estrago. A culpa, em parte, é das lideranças que não prepararam o povo adequadamente para enfrentar estes erros. Mas, a responsabilidade é principalmente dos pastores de igrejas históricas que traindo e abandonando os compromissos que fizeram por ocasião de sua consagração e ordenação, adotaram eles mesmos estas práticas estranhas ao cristianismo histórico, no afã de crescer, ganhar adeptos e aumentar o seu ministério. E não podemos esquecer que se as seitas neopentecostais têm um grande volume de adeptos, isto se deve também ao fato de que tem muita gente interessada em Deus por motivos errados, como saúde, prosperidade e sucesso, deixando a razão maior para trás, que é a glória do próprio Deus.  

ECLÉSIA: Os últimos números das pesquisas apontam para um aumento grande do número de pessoas que acreditam em Deus mas não tem uma religião específica. Ou, pelo menos, que não estão em uma denominação evangélica. Provavelmente, porque já estiveram e saíram. Quem é o maior culpado por isso: os abusos cometidos pelos líderes ou o triunfalismo pregado dos púlpitos e que, na prática, não alcança resultados?
Acho que as duas coisas. E devemos nos humilhar e nos penitenciar diante de Deus por isto. Mas eu ainda acrescentaria uma terceira razão, que é a tendência do coração humano de não se sujeitar à disciplina, liderança, governo espiritual e a seguir normas e regras. As igrejas cristãs – pelos menos as sérias –  são organizadas de acordo com o padrão bíblico, têm uma liderança espiritual constituída e seguem normas encontradas na Palavra de Deus. Obviamente nem todo mundo tem disposição para fazer parte de uma comunidade onde ficará sujeito a cobranças, questionamentos e perguntas sobre sua vida individual, sobre seu comportamento, hábitos e decisões. Ou seja, muita gente que se considera evangélica não quer a responsabilidade inerente à membresia de uma igreja séria. Em resumo, o crescimento do número dos desigrejados se dá tanto pela falha da igreja organizada quanto pela rebeldia de boa parte dos próprios desigrejados.

ECLÉSIA: Em seu último livro, o senhor aborda temas como o fato do crente ficar ou não doente e a prática de expulsar o diabo. Particularmente, o senhor já viu casos escabrosos ou até esteve presente diante de práticas estranhas e que o motivaram a escrever sobre isso? Pode falar sobre elas?
Sobre crentes ficarem doentes, não creio que precisemos dar evidências e provas disto. É claro que ficam. E nem sempre é falta de fé, resultado de um pecado específico ou demonização. Já orei por gente que ficou boa e também por gente que morreu em seguida. É Deus quem cura, quando quer e se quiser. Já me deparei com diversos casos de possessão demoníaca em meu ministério. Alguns deles, verifiquei em seguida, não se tratavam realmente de possessão. Mas pelo menos dois deles só consigo explicar como sendo casos reais de possessão demoníaca. Acredito que a possessão demoníaca é uma realidade em nossos dias, mas não acredito que tudo que se considera como tal, nas igrejas neopentecostais, é de fato possessão. Há muita mistificação e engano, muita confusão de sintomas de doenças mentais e distúrbios psicológicos com demonização.

ECLÉSIA: Mas batalha espiritual é um assunto bíblico. Só que o senhor já disse que esse conceito foi contaminado pelo paganismo que se infiltrou no meio eclesiástico. Como assim?
Sem dúvida, a batalha espiritual é um assunto totalmente bíblico. Paulo nos diz em Efésios 6 que nossa luta real é contra os principados e potestades, as forças espirituais do mal nos lugares celestiais. Não tenho dúvidas quanto a isto. Satanás é real e suas tentações e seu poder são reais. Ele está presente e ativo no planeta Terra, como já disse alguém. O problema não é este, mas sim como enfrentamos Satanás e suas forças. O moderno movimento de batalha espiritual ensina conceitos e práticas que não encontram fundamentação bíblica, como quebra de maldições, espíritos territoriais, oração de guerra, mapeamento espiritual, cobertura espiritual, demônios associados com doenças específicas, associação dos nomes das divindades pagãs do umbandismo com espíritos malignos determinados, - enfim, a lista é grande. Procuramos em vão no relato bíblico da vida e obra de Jesus e dos apóstolos evidências de que eles faziam mapeamento espiritual, demarcação de território, amarração de potestades, quebra de maldições. Para mim, a igreja não deve adotar práticas que não sejam claramente apoiadas pela Escritura. A fonte de autoridade para estas práticas no movimento de batalha espiritual não é a Bíblia, mas declarações de pessoas endemoninhadas, sonhos, visões, palavras proféticas, supostas revelações e outras fontes subjetivas que acabam tomando o lugar da Palavra de Deus na vida do crente e da igreja. Isso tudo abre a porta para a entrada de crendices, misticismo e paganismo na igreja.

ECLÉSIA: Por outro lado, o senhor diz que não é totalmente contra o Natal. Mas essa festa não tem origens e práticas pagãs, como a própria árvore e as luzinhas? Não seria uma contradição?
As festividades natalinas modernas com árvore de natal, luzinhas, Papai Noel, ceia com peru, troca de presentes e onde nem se menciona o nome de Jesus Cristo são claramente uma prática não cristã. A origem desta prática realmente é pagã, mas não a idéia de celebramos o nascimento do nosso Salvador Jesus Cristo. Se os anjos se alegraram com o nascimento dele, formando um coral celestial para entoar louvores a Deus, se os pastores e os magos foram adorá-lo e se a encarnação de Deus Filho é considerada na Bíblia um evento crucial da história da salvação – sem o qual não haveria sua morte e a sua ressurreição – vejo como perfeitamente cristão celebrar o nascimento do Salvador. Como não sabemos a data exata de seu nascimento, seguimos a antiga convenção cristã de fazê-lo no dia 25 de dezembro. Poderia ser em outro dia qualquer. Natal não é dia santo.

ECLÉSIA: As igrejas por aqui geralmente são acusadas de copiar tudo dos Estados Unidos. De bom e de ruim. Inclusive, práticas espirituais, demonizando a cultura nacional. De que maneira podemos forjar uma espiritualidade bíblica e ao mesmo tempo brasileira?
É um equívoco demonizar a cultura brasileira – ou outra qualquer – como um todo. Como calvinista, creio na graça comum, isto é, que Deus abençoa as pessoas com habilidade e capacidade para fazerem arte, música, cultura, descobertas científicas, mesmo aquelas que não o conhecem e até o negam. Portanto, encontraremos em qualquer cultura coisas boas que refletem a bondade do Criador. Além disto, a verdadeira espiritualidade não tem nacionalidade e transcende as barreiras geográficas e étnicas. Os profetas  e os apóstolos eram judeus e viveram numa cultura antiga que já nem existe mais, o Antigo Oriente. Todavia, a espiritualidade deles é a base da nossa. A verdadeira espiritualidade consiste em viver neste mundo de acordo com a vontade de Deus revelada nas Escrituras. E isto nos Estados Unidos, no Brasil ou na China. É claro que o homem espiritual haverá de adaptar-se à sua cultura, mas a base e a fonte de sua espiritualidade sempre será a pessoa de Jesus Cristo, conforme revelada nas Escrituras. Isto não significa negar que se copia muita coisa aqui, não só dos Estados Unidos, mas da Coréia, por exemplo. Todavia, se o que os crentes americanos estão fazendo é biblicamente correto e saudável, qual é o problema em aprender com eles ou com crentes da China e da África? Tem muito nacionalismo irracional no meio evangélico. Tem gente que fala de teologia brasileira, louvor brasileiro, espiritualidade brasileira como se fosse possível isolar este ente etéreo chamado “brasilianidade” da cultura global em que vivemos hoje. As próprias culturas em que a Bíblia nasceu e foi escrita eram misturadas. Copiavam-se práticas, costumes e tradições. Não vejo nenhum problema em aproveitar o que cristãos de outros países fazem certo, desde que o critério final seja a coerência e a conformidade com as Escrituras.

ECLÉSIA: Qual a maior ameaça à Igreja brasileira: as inovações neopentecostais, o liberalismo, o fundamentalismo, o teísmo aberto ou as novas tentativas de reforma?
Cada um destes movimentos representa uma ameaça em seus próprios termos. Eu diria que o liberalismo teológico e as inovações pentecostais são as mais perigosas pelo volume de adeptos e pelo radicalismo. O teísmo aberto é um movimento praticamente defunto no Brasil, pois não encontrou respaldo quer entre os calvinistas, quer entre os arminianos, em razão de negar uma doutrina preciosa para ambos, que é a onisciência de Deus.

ECLÉSIA: Ultimamente os emergentes e grupos que combatem a aridez e os modismos de grandes denominações aparecem como opção para uma nova espiritualidade. O que o senhor pensa dela?
Existem vários tipos de emergentes. Há um movimento dentro dos emergentes que se identifica com o liberalismo teológico e sobre este movimento a minha opinião é a mesma que tenho sobre os liberais. Mas há um movimento emergente que quer manter o compromisso com as doutrinas centrais da Palavra de Deus, com a pregação bíblica, com uma vida pautada pelas normas cristãs de amor ao próximo e santidade de vida. E ao mesmo tempo, querem ser relevantes para sua geração. Eles defendem um culto diferente dos cultos das igrejas tradicionais, mais informal, com música contemporânea e uma ordem litúrgica menos elaborada. Há inclusive um movimento vigoroso de reapreciação pela teologia e práxis da Reforma protestante, que vem exercendo muita influência nas igrejas históricas e nas pentecostais. Eu vejo com muita simpatia este movimento.

ECLÉSIA: Falando em debate e em polêmica, recentemente houve uma discussão pelas redes sociais entre o bispo Edir Macedo, líder da IURD, e a cantora e pastora batista Ana Paula Valadão sobre as manifestações do Espírito Santo. Um dizia que só cai no chão quem é endemoninhado. A outra, que alguém que recebe a unção de Deus pode cair. Como o senhor vê esse debate?
Não acompanhei esta discussão, mas estou familiarizado com o assunto. Estive a muitos anos na Igreja do Aeroporto, em Toronto, da Vineyard, onde começou o movimento da “bênção de Toronto,” que é onde nasceu esta prática de “cair no Espírito.” Estranhei bastante o que vi lá, pois ao comparar as quedas com os relatos de quedas na Bíblica ficava evidente o contraste. Na Bíblia, as pessoas que caíram diante da presença de Deus caíram sobre seus rostos e joelhos, não de costas. Caíram diante do descobrimento do seu próprio pecado, da santidade de Deus ou da glória de Cristo. Em nenhuma destas ocorrências as quedas aconteceram por causa de unção com óleo ou imposição de mãos dos profetas, de Jesus e dos apóstolos. E não encontramos em lugar nenhum da Bíblia qualquer orientação para os crentes sobre este assunto. No caso dos endemoninhados, também não há qualquer registro de gente endemoninhada caindo quando Jesus ou os apóstolos lhes impuseram as mãos. Sempre, o que havia, era a expulsão imediata dos demônios, sem muita conversa. Assim, se eu for tomar a Bíblia como referencial, eu diria que não temos como demonstrar biblicamente que pessoas cheias do Espírito caem no chão e nem que endemoninhados caem no chão na hora do exorcismo.

ECLÉSIA: Já se falou muito em dentes de ouro, risada santa e até em adoração extravagante. Que modismos estão afetando atualmente a Igreja e com quais crentes e lideranças devem ficar atentos?
A lista é grande demais para caber aqui numa entrevista destas... sugiro que consultem o blog do Pr. Renato Vargens, que documenta em detalhes estes modismos.

ECLÉSIA: Em partes tudo isso também não é culpa das lideranças e da formação que elas recebem nas faculdades teológicas? Ou da falta de formação para quem não estuda? Um de seus textos, no último livro, questiona por que tantos seminaristas perdem a fé...
Sem dúvida. Quando um pastor desconhece a história da igreja, a história das doutrinas, a teologia bíblica e teologia sistemática, quando ele não tem nem mesmo as noções mais básicas de grego e de hebraico, quando lhe falta o conhecimento dos grandes credos e confissões da igreja cristã, desconhece as polêmicas teológicas e a obra dos grandes vultos da Igreja Cristã, sua tendência será levar avante o seu ministério na base do improviso, da intuição e do pragmatismo. Ele vai usar como modelo aquelas instituições religiosas que aparentemente conseguiram sucesso em arrebanhar pessoas. Pior ainda, se nos seminários e institutos bíblicos ele teve professores liberais, sairá no mínimo um pastor confuso, incerto e sem convicção sobre nada – e portanto aberto a todo tipo de prática e crença que lhe garanta a posição e o sustento.

ECLÉSIA: Há pouco tempo, o país enfrentou o debate sobre o ensino do criacionismo nas escolas. Depois, a discussão foi sobre o ensino religioso. Como chanceler de uma das mais importantes universidades confessionais brasileiras, de que forma vê a questão?
Esse assunto é muito complexo. A Constituição brasileira e a Lei de Diretrizes e Bases reconhecem a educação confessional, que é aquela feita por instituições de ensino que se orientam por uma ideologia específica. Portanto, instituições de ensino confessionais têm liberdade de ensinar sua ideologia desde que cumpram satisfatoriamente os requisitos e parâmetros curriculares determinados pelo MEC. Não creio que se deva abolir o ensino do evolucionismo nas escolas confessionais. Mas creio que ao lado do evolucionismo se deveria mostrar que existe outra opinião, defendida por cientistas renomados e sérios, quanto à questão da origem das espécies, como, por exemplo, a teoria do Design Inteligente. Isto cumpriria perfeitamente o ideal de pluralidade que se espera de uma escola e de uma universidade. Como está, apenas uma posição é ensinada, como se a mesma não fosse contestada por muitos. É uma ilusão pensar que o ensino pode ser feito de maneira isenta, neutra ou cientificamente laica. Não existe isto. Toda educação parte de uma visão de mundo pré-concebida. Se não for uma cosmovisão religiosa, será uma materialista, humanista, naturalista ateísta, marxista... Portanto, o ensino confessional cristão tem legitimidade. Sobre o ensino religioso, acho que num país onde cerca de 90% da população diz crer em Deus e estar afiliada a alguma religião por si só já é argumento suficiente para não se ignorar a dimensão religiosa e o papel importante que ela desempenha na vida dos brasileiros. 

ECLÉSIA: Universidades confessionais têm enfrentado várias crises nos últimos tempos. Tome-se como exemplo a PUC de São Paulo e a Ulbra do Rio Grande do Sul. Não estão administrando o ensino como tomam conta das igrejas? Como o senhor avalia a situação das escolas confessionais e o que o Mackenzie tem a ensinar sobre o assunto?
Eu diria apenas que o setor educacional privado no Brasil, como um todo, atravessa profundas dificuldades administrativas, financeiras e estruturais. As instituições confessionais de ensino, inclusive as universidades confessionais também são atingidas, algumas mais, outras menos. Os desafios são muito grandes.

ECLÉSIA: Recentemente, o Mackenzie foi alvo de protestos por parte de ativistas homossexuais por conta de um texto em seu site que criticava o PLC 122/06. Como o senhor vê esse debate sobre o casamento gay no Brasil? Os evangélicos não correm sérios riscos de serem submetidos a uma mordaça?
É preciso esclarecer os fatos. O que foi publicado no site do Mackenzie nada mais era que o posicionamento da Igreja Presbiteriana do Brasil tomado em 2007 pelo seu Supremo Concílio. Estava no site do Mackenzie desde aquele ano, pois a IPB é a Associada Vitalícia da instituição e suas decisões precisam ser conhecidas. É claro que toda violência feita a um homossexual deve ser punida. Quem agride gays deve ser preso e responder a processo. Aliás,  quem agride qualquer cidadão brasileiro, independentemente de sua escolha sexual, deve ser preso. É lamentável quando jovens saem às ruas de noite para espancar gays e travestis. Não podemos concordar jamais com este tipo de atitude – da mesma forma que não podemos concordar com agressões feitas a qualquer pessoa. Acredito que as pessoas têm o direito de escolher o tipo de vida que desejam levar e que não deveriam agredir nem afrontar quem pensa diferente. A Constituição Brasileira garante o direito à liberdade de consciência, religião e expressão. Assim sendo, não posso apoiar nenhum projeto que intente dar direitos especiais a um grupo de brasileiros em detrimento da liberdade de consciência, expressão e religião de outros. Sobre o casamento gay, é claro que sou contra, pois além do conceito ser contrário às minhas convicções cristãs, considero-o um fator de risco para a família. Quanto à mordaça sobre os evangélicos, é bem possível que venha a acontecer, mas a Igreja cristã nunca deixou de cumprir o seu papel de anunciar o perdão de Deus aos pecadores arrependidos mesmo em sociedades hostis, como no primeiro século da era cristã, sob o Império Romano. Lá não tinha mordaça, mas leão, cruz e espada para os dissidentes.

ECLÉSIA: Há pouco, quem esteve no Mackenzie foi John Piper, participando de debates que tiveram sua presença e a de Russel Shedd. Nos últimos anos, a universidade tem sido palco de congressos e grandes eventos que atraíram importantes nomes da fé cristã. De que maneira isso ajuda no amadurecimento da fé evangélica no país?
A realização destes eventos só é possível por causa do apoio da alta direção do Mackenzie, que é composta de cristãos sérios e comprometidos com a qualidade da educação e a visão cristã de mundo. A visão deles, da qual sou um dos executores como Chanceler, é de que o Mackenzie deve contribuir para a sociedade não somente oferecendo ensino de alta qualidade, como vem fazendo há décadas, mas também mostrando que o Cristianismo não exige que abandonemos a intelectualidade, a erudição, a cultura e o bom senso. Por isto, trazemos nomes de peso mundial para nos falar. Para o ano que vem (2012) planejamos trazer Dra. Nancy Pearcey, renomada historiadora da ciência, Dr. W. Lane Craig, um dos apologetas cristãos mais conhecidos hoje, que atua junto às grandes universidades do mundo, Dr. Michael Behe, cientista e biólogo renomado e considerado o pai da teoria do Design Inteligente, além do Pr. Paul Washer, um dos pregadores mais conhecidos dentre aqueles cujo ministério é voltado para os jovens.

ECLÉSIA: O senhor é um entusiasta da internet. Seus textos no blog já viraram até livro. A Igreja tem aproveitado bem a tecnologia e as redes sociais? Ou o mundo virtual é mais uma ameaça à fé do real?
A igreja tem aproveitado bem a tecnologia e as redes sociais. Os evangélicos têm presença marcante nas mídias sociais. Mas, é claro, esta participação pode melhorar, com a inserção de material mais sólido, sério, e que tenha potencial para formar esta nova geração. Portanto, não vejo a tecnologia como uma ameaça – desde que corretamente usada, como tudo o mais na vida.

ECLÉSIA: O senhor é reverendo presbiteriano mas tem trânsito entre várias correntes e denominações. Durante muito tempo, a Igreja Presbiteriana foi criticada por ser fechada. Isso está mudando?
No que tange à minha denominação, não creio que a Igreja Presbiteriana do Brasil tenha sido fechada no passado. Os presbiterianos sempre foram abertos para os irmãos de denominações reconhecidamente evangélicas. Não rebatizamos quem vem destas denominações e servimos a Ceia a todos os que são membros de igrejas evangélicas. Não temos proibição de convidarmos pregadores de outras denominações para nossos púlpitos e nem de participarmos de eventos conjuntos com eles. O que realmente não concordamos é com aqueles que se dizem cristãos mas negam a inerrância da Palavra de Deus, os milagres da Bíblia, a ressurreição de Cristo e sua morte vicária. Também queremos distância das práticas neopentecostais e das seitas. Quanto à minha pessoa, se tenho algum trânsito em outros setores evangélicos isto talvez se deva à principal ênfase do meu ministério, que é pregar expositivamente a Palavra de Deus. Evangélicos de todas as denominações amam a Bíblia e gostam de ouvir explicações sobre ela feitas com simplicidade e clareza.

ECLÉSIA: Sua trajetória pessoal é pontuada por uma sólida formação acadêmica. Sempre que isso acontece, surge o questionamento: como conciliar conhecimento com uma fé viva e dinâmica. Qual é seu segredo? O que diria para jovens ministros que estão começando a carreira e não querem deixar de crer diante de uma Igreja com tantos problemas?
Conhecimento e fé viva não são opostos e nem inimigos. Essa dicotomia é resultado da visão iluminista e racionalista de mundo que prevalece na cultura ocidental desde o século dezoito, que estabeleceu a razão como o critério final da realidade. Antes disto, este conflito estava ausente na vida dos grandes cientistas que nos deram a moderna ciência e que eram, na maior parte, cristãos. Todo conhecimento pressupõe um princípio unificador que serve de orientação e sustentação. A crença na existência de um Deus criador, que é amor e justiça, santidade e misericórdia, que fez o mundo segundo princípios e leis e criou o ser humano à sua imagem, funciona perfeitamente como princípio unificador para o conhecimento. Sendo assim, meu conselho aos jovens pastores é que cultivem a sua mente com a mesma energia com que cultivam a sua vida devocional. Estudem, pesquisem, escrevam, perguntem, discutam. Procurem não somente uma sólida formação espiritual como também bíblico-teológica-geral. 
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terça-feira, janeiro 10, 2012

Augustus Nicodemus Lopes

A Bíblia no Brasil e suas traduções

Por     12 comentários:
Nesta entrevista com Dr. Rudi Zimmer abordamos a importância da Bíblia e a questão das traduções. Tenho minhas reservas quanto à Nova Tradução na Linguagem de Hoje como texto base para pregações e estudos, embora sempre a consulte como apoio.

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segunda-feira, janeiro 09, 2012

Augustus Nicodemus Lopes

A Ciência Pode Enterrar a Deus? Entrevista com Dr. Eberlin

Por     6 comentários:
Tive a oportunidade entrevistar o químico da UNICAMP, Dr. Marcos Eberlin, sobre questões como a relação entre a ciência e Deus, fé e religião. Assista aqui:


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terça-feira, janeiro 03, 2012

Augustus Nicodemus Lopes

Calvino, o Teólogo do Espírito Santo

Por     10 comentários:
Meu tema nesta postagem é "Calvino, o teólogo do Espírito Santo." Devo começar dizendo que este título não foi dado a Calvino pelos seus contemporâneos, mas sim pelos estudiosos modernos, reconhecendo a sua importância como teólogo e exegeta para esta área da Teologia que está em tanta relevância hoje. 

O título pode confundir algumas pessoas. Podem pensar que o assunto sobre o qual Calvino mais escreveu, e ao qual mais se dedicou, foi o Espírito Santo. Na realidade, embora Calvino tenha escrito muita coisa sobre o Espírito Santo, nunca escreveu uma obra específica sobre o assunto, como, por exemplo, John Owen e Abraham Kuyper, cujos livros sobre o tema são fundamentais para a Igreja contemporânea.(1) Embora em suas Institutas de Religião Cristã João Calvino trate freqüentemente da pessoa e obra do Espírito Santo, não dedicou ao assunto um capítulo exclusivo.(2)

Alguns têm criticado Calvino por não haver dado atenção mais direta ao Espírito Santo em seus escritos, especialmente nas Institutas . A crítica é injusta. Existem razões suficientes para esta aparente falta de atenção.

Em primeiro lugar, a doutrina do Espírito Santo não era o foco do debate de Calvino com a Igreja Católica Romana da sua época, e nem da sua polêmica com os reformadores radicais, os Anabatistas e os "Entusiastas", conhecidos como a ala de esquerda da Reforma. (3) Calvino só tratou da obra do Espírito Santo na medida em que esse assunto se relacionava com os pontos críticos em debate, como a doutrina da salvação, da santificação, das Escrituras, e dos sacramentos.

Em segundo lugar, Calvino tinha a visão bíblica-neotestamentária de que o Espírito Santo geralmente agia nos bastidores, como o agente da Trindade. Embora sua ação fosse claramente perceptível, quem deveria sempre receber a proeminência eram o Pai e o Filho. Essa convicção reflete-se nas suas obras e em sua abordagem dos mais variados temas teológicos. Não existe praticamente nenhum assunto teológico em que Calvino não se refira, em seu tratamento, à obra do Espírito. Sua Pneumatologia é desenvolvida dentro das demais áreas da Teologia Sistemática, como Teontologia (estudo da Pessoa de Deus), Soteriologia e Eclesiologia.

Esta mesma abordagem se encontra refletida na Confissão de Fé de Westminster. É verdade que seus autores, os Puritanos, não escreveram um capítulo exclusivo sobre a pessoa e obra do Espírito. Mas, como sugeriu Dr. Benjamim B. Warfield, conhecido teólogo presbiteriano reformado, do início deste século, a razão é que preferiram escrever nove capítulos em vez de apenas um. A tentativa que foi feita em nossa época, pela Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos, para suprir esta alegada deficiência, produziu um capítulo a mais na Confissão de Fé que, segundo Warfield, nada mais é que um curto sumário destes nove capítulos originais. (4)

E por fim, não se pode exigir de Calvino (e nem dos autores da Confissão de Fé) uma abordagem do assunto que seja aguçada pelas questões relacionadas com o surgimento do movimento pentecostal, séculos após a sua morte. Mesmo assim, Calvino é surpreendentemente atual no que diz sobre o Espírito.

Por que, então, o título "teólogo do Espírito Santo?" Em primeiro lugar, Calvino foi o primeiro a sistematizar de forma clara o ensino bíblico sobre o Espírito Santo. Não é que ninguém, antes dele, não houvesse escrito sobre o assunto. Mas, é que poucos, antes e depois de Calvino, conseguiram ser tão claros, simples, e bíblicos.(5) 

Ouçamos o testemunho de Dr. Warfield:
A doutrina sobre a obra do Espírito Santo é uma dádiva de João Calvino à Igreja de Cristo...Nos amplos departamentos doutrinários sobre "A Graça Comum," "Regeneração," e "O Testemunho do Espírito" do livro terceiro das Institutas, Calvino foi o primeiro a desenvolver a doutrina da obra do Espírito Santo, e a dar a toda a doutrina do Espírito Santo uma formulação sistemática, fazendo dela uma possessão inalienável da Igreja de Deus.(6)
Em segundo lugar, Calvino integrou indissoluvelmente a doutrina do Espírito Santo aos demais temas e áreas da teologia, como regeneração, santificação, os meios de graça, e o conhecimento de Deus, entre outros. A Pneumatologia de Calvino, igualmente, abrangia e permeava todos os demais departamentos da Enciclopédia Teológica. Sua teologia é uma unidade orgânica, onde o Espírito aparece apropriadamente como o Soberano dinamizador.

Em terceiro lugar, Calvino resgatou alguns aspectos da doutrina do Espírito Santo que estavam soterrados debaixo da teologia medieval da Igreja Católica, como por exemplo, a relação entre a Palavra e o Espírito. Nosso alvo neste ensaio é analisar mais exatamente esta contribuição de Calvino para nosso conhecimento da obra do Espírito Santo, ou seja, a relação vital e orgânica entre o Espírito e a Palavra de Deus, as Escrituras.

O ensino de Calvino influenciou profundamente os estudos subsequentes dentro dos círculos Reformados. Sua ênfase na ação soberana do Espírito continua na tradição reformada entre os Puritanos ingleses, particularmente John Owen e Richard Sibbes, que nos deram os estudos bíblicos teológicos mais extensos e profundos que existem em qualquer língua sobre o ministério do Espírito Santo.

O Contexto Teológico de Calvino

Comecemos por lembrar-nos que a teologia de Calvino nasceu e desenvolveu-se em meio ao intenso conflito doutrinário que marcou a Reforma do século XVI. Sua doutrina do Espírito Santo foi moldada em meio à sua batalha em duas frentes. Em uma, ele enfrentava o cativeiro das Escrituras pela Igreja Católica, e na outra, o abandono das Escrituras pelos da Reforma radical.

A Igreja Católica e o cativeiro das Escrituras
Calvino e a Igreja Católica tinham algumas convicções em comum quanto à doutrina das Escrituras. Para eles, as Escrituras eram a Palavra de Deus, inspiradas pelo Espírito Santo, infalíveis, e autoritativas. Este ponto não estava sendo disputado por Calvino, nem pelos demais reformadores. O ponto de discórdia entre Calvino e os católicos era quanto ao ensino papista de que a autoridade da Escritura dependia do testemunho da Igreja. A Igreja Católica afirmava que o cânon das Escrituras, a sua preservação, a sua origem divina e sua autoridade, deviam ser aceitos pelos fiéis como verdadeiros porque a Igreja assim o afirmava. A autoridade das Escrituras, enfim, dependia do testemunho da Igreja. A Igreja, além disto, tinha a correta interpretação das Escrituras; a coleção dessas interpretações formava a tradição eclesiástica, que possui tanta autoridade quanto as próprias Escrituras. Assim, era vedado aos católicos leigos lerem e interpretarem as Escrituras. Eles dependiam da interpretação dada pela Igreja. Desta forma, a Palavra e a sua interpretação estavam cativas debaixo da autoridade eclesiástica.

Calvino levantou-se contra esse estado de coisas, que havia prevalecido durante a Idade Média. Ele considerava esse ensino como sendo uma afronta ao Espírito Santo, e um abuso de autoridade por parte da Igreja. Era a Igreja que estava fundada sobre as Escrituras, e não o contrário. A autoridade das Escrituras não dependia do testemunho da Igreja, e sim o contrário: a Igreja só possuía autoridade enquanto estivesse dentro da doutrina bíblica. Calvino apelava aqui para Ef 2.20, onde Paulo ensina que a Igreja está edificada sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, que é o ensino das Escrituras.(7) A Igreja simplesmente reconhecia — não estabelecia e nem determinava a inspiração e a autoridade dos livros que compunham o cânon sagrado.(8)

Para Calvino, a maior de todas as provas da autoridade e inspiração das Escrituras era que o próprio Deus nos falava através delas. Calvino chamava a isto o testemunho interno do Espírito .(9) Para ele, o homem natural não poderia ser convencido da divindade das Escrituras por argumentos apresentados pela Igreja, por mais lógicos e racionais que eles parecessem (1 Co 2.14).(10) Era o Espírito quem persuadia o crente de que Deus estava falando nas Escrituras , inclinando-lhe o coração a aceitá-las, e dando-lhe plena certeza disto, gerando-lhe fé em seu coração. Nas suas Institutas e comentários Calvino aponta para alguns textos com este efeito, como por exemplo, 1 Jo 5.6-7, 2 Tm 1.14-15, 1 Co 2.10-16.(11)

Para Calvino, o que o Espírito havia revelado nas Escrituras era suficiente e final. Maomé, o Papa, e os "Entusiastas" estavam errados, ao reivindicar que o Espírito estaria ensinando novas verdades no presente. Para Calvino, as palavras do Senhor Jesus em Jo 14.25 deixavam claro que o ministério do Consolador consistiria, não em revelar novas verdades, que fossem além das que haviam sido ensinadas pelo Senhor Jesus e seus apóstolos, mas em iluminar as mentes e os corações dos crentes, para que compreendessem e cressem nas verdades, agora registradas na Escritura. Ele afirma: "O espírito que introduz qualquer doutrina ou novidade que vá além do Evangelho, é um espírito de mentira, e não o Espírito de Cristo."(12)

O efeito do ensino de Calvino foi libertador.(13) Através da ênfase no testemunho interno do Espírito Santo como a evidência máxima da divindade e da autoridade das Escrituras, ele libertou as Escrituras e a sua interpretação do cativeiro imposto pela Igreja Medieval, e as colocou de volta onde elas pertenciam de direito, nas mãos do Espírito Santo. Neste sentido, estava certa a avaliação de alguns católicos encarregados da contra-reforma no século XVII, de que uma das maiores diferenças que existiam entre Roma e Genebra se encontrava em suas doutrinas sobre a pessoa e a obra do Espírito Santo.

Os Reformadores Radicais
e seu Desprezo pela Palavra
A outra fronte de batalha de Calvino era contra o ensino da Reforma radical , conhecida como a "ala esquerdista" da Reforma.(14) Havia diversos grupos dentro desta ala do movimento reformista. Havia, em primeiro lugar, como os Anabatistas, os "Fanáticos", os "Espiritualistas" e os Antitrinitarianos, que "embora diferentes em seus propósitos e em suas doutrinas, tinham em comum o desejo de ver uma Reforma muito mais radical do que a propagada por Lutero e Zwinglio."(15) A polêmica de Calvino contra os Anabatistas concentrou-se em questões como batismo infantil, predestinação, governo de Igreja, relação entre Igreja e Estado, e interpretação das Escrituras.(16)

Foi contra os excessos dos "Entusiastas" ou "Fanáticos" (como eram conhecidos) na área de novas revelações contemporâneas do Espírito, que Calvino se concentrou em alguns de seus escritos. Ele escreveu um tratado em 1545 entitulado Contre la secte phantastique et furieuse des Libertines qui se nomment spirituelz (Contra a seita fantástica e furiosa dos Libertinos, que se chamam de Espirituais), que ainda não foi traduzido para o português.(17) Freqüentemente em suas Institutas e comentários Calvino faz menções diretas ou sugestões implícitas sobre este movimento.

Os "Entusiastas" enfatizavam o ministério didático do Espírito, um ponto que havia sido resgatado pelos Reformadores; porém, estavam indo além deles, reivindicando serem ensinados diretamente pelo Espírito através de novas revelações, por meio de uma luz interior . Afirmavam que o Espírito não podia ficar restrito a palavras escritas, pois isto diminuiria sua soberania. Testar as manifestações espirituais seria desonrar o Espírito. Chegavam a ridicularizar os que se apegavam às Escrituras, pois a consideravam como uma forma inferior e temporária de revelação, e criticavam Calvino e os demais reformadores por se apegarem à letra que mata.

Os "Entusiastas," portanto, eram uma reação à escravidão das Escrituras por parte da Igreja que havia vigorado até a Reforma, mas uma reação que estava indo longe demais. Calvino, naturalmente, simpatizava-se com os "Entusiastas" em vários pontos. Para ambos, as Escrituras, como Palavra de Deus, não estavam cativas à interpretação da Igreja, mas deveriam ser livremente examinadas por todos. 

Calvino, porém, questionava seriamente a separação entre o Espírito e a Palavra, e considerava qualquer tendência neste sentido como "demência".(18) Ele também duvidava que "novas revelações" fossem uma obra do Espírito Santo, e chegava mesmo a suspeitar que os que reinvidicavam receber revelações novas, que excediam as Escrituras, estavam sendo guiados por outro espírito, que não o de Deus. Calvino cria na realidade e na atuação de espíritos mentirosos, e que Satanás estava continuamente iludindo as pessoas, procurando afastá-las da verdade, transfigurando-se em "anjo de luz" (2 Co 11.3,14). Para ele, "novas revelações", na verdade, eram invenções de espíritos mentirosos, não provinham do Espírito Santo, sendo o cumprimento de passagens como 1 Tm 4.1-2.(19)

O Ensino de Calvino sobre o Espírito e a Palavra
Calvino não se limitou a criticar os exageros dos "Entusiastas." Ele apresentou, de forma positiva e construtiva, o ensino bíblico sobre a direção divina para a Igreja vivendo após os tempos apostólicos. No livro I das suas Institutas , onde trata de "O Conhecimento de Deus como Criador", Calvino dá o seguinte título ao capítulo 9: Os fanáticos, abandonando as Escrituras e bandeando-se para revelação, derrubam todos os princípios da piedade . Nesse capítulo, o reformador aborda o ensino dos "Fanáticos", como eram conhecidos na época, a partir da inseparável relação entre o Espírito e a Palavra.(20)

O Espírito Fala pelas Escrituras
O ponto central de Calvino era que o Espírito fala pelas Escrituras . Não que o Espírito estivesse restrito à Pregação da Palavra e aos sacramentos, mas sim que Ele não pode ser dissociado de ambos. O Espírito havia sido dado à Igreja, não para trazer novas revelações, mas para nos instruir nas palavras de Cristo e dos profetas. De acordo com Calvino, o Espírito sela nossas mentes quando ouvimos e recebemos com fé a palavra da verdade, o Evangelho da salvação (Ef 1.13). Ele limita-se a guiar os crentes e a iluminar seus entendimentos naquilo que ouviu e recebeu do Pai e do Filho, e não de Si mesmo (Jo 16.13). Como o ensino divino se encontra nas Escrituras, a obra do Espírito consiste em iluminá-las, fazendo com que esse ensino seja entendido pelos fiéis.

Contra o desprezo pelas Escrituras da parte de muitos "Entusiastas," Calvino citava o exemplo do apóstolo Paulo, que mesmo tendo sido arrebatado ao terceiro céu, onde recebeu revelações extraordinárias (2 Co 12.2), ainda assim jamais desprezou as Escrituras, como se fossem uma forma inferior de revelação, mas as reconheceu como suficientes e eficazes, pela graça do Espírito, para edificar a Igreja em todas as coisas concernentes ao reino de Deus (2 Tm 3.15-17; cf. 1 Tm 4.13).(21)

O Espírito é reconhecido pela sua harmonia com as Escrituras
Outro ponto importante destacado por Calvino nas Institutas era que a atuação do Espírito Santo poderia ser reconhecida pela sua harmonia com as Escrituras, as quais haviam sido inspiradas pelo próprio Espírito.(22) Calvino desejava apresentar um critério pelo qual a Igreja pudesse discernir de forma segura, no âmbito da experiência religiosa, o que realmente procedia da parte do Espírito de Deus, ou de espíritos enganadores. Para ele, havia somente um critério seguro e infalível: o Espírito falando nas Escrituras. Assim, não haveria qualquer diminuição do poder e da glória do Espírito Santo ao concordar com elas, já que Ele as havia inspirado. Seria concordar consigo mesmo, e qual a desonra que poderia haver nisto? Testar as manifestações supostamente provenientes do Espírito, usando-se o crivo das Escrituras, era, na realidade, agradável a Ele, pois Ele mesmo havia determinado que a Igreja assim procedesse com as manifestações espirituais.(23) Para Calvino, não poderia haver qualquer contradição entre o ensino bíblico e a atuação do Espírito nos tempos pós-apostólicos; e é por esta razão que ele frequentemente se refere às Escrituras como "a imagem do Espírito."(24)

A Soberania do Espírito
Um último ponto ao qual desejo me referir é a insistência de Calvino sobre a soberania do Espírito Santo nesta relação íntima com a Palavra de Deus. Para ele, a Palavra é o instrumento pelo qual Deus dispensa a iluminação do Espírito aos crentes.(25) Assim, Cristo fala hoje através do ministro do Evangelho, quando o mesmo expõe fielmente a Palavra. O Espírito torna eficaz a Palavra exposta nos corações dos que a ouvem. Ao mesmo tempo, a relação Espírito-Palavra não é mágica, ou automática. A Palavra não é como um talismã , que sempre que invocado, libera seu poder mágico, ao bel-prazer do seu possuidor. A eficácia da Palavra, ao contrário, está totalmente na dependência da soberania do Espírito. (26) 

Para Calvino, a afirmação de Paulo de que somos ministros de uma nova aliança, do Espírito que vivifica (2 Co 3.6), não é uma garantia de que nossa pregação sempre será acompanhada pelo poder vivificador do Espírito. Pastores não retém o poder de dispensar a graça do Espírito a qualquer um que desejem, e quando o desejem. É por um ato soberano que o Espírito torna a Palavra pregada em Palavra eficaz.(27)

Assim, a eloquência, a habilidade, a erudição e o fervor do pregador de nada adiantam, se a graça e o poder do Espírito não estiverem presentes. E assim ocorre porque, o mérito sempre deve ser de Cristo ,
e não dos pregadores.

A Influência de Calvino na Confissão de Fé de Westminster
A Confissão de Fé de Westminster, adotada pela Igreja Presbiteriana do Brasil, foi elaborada no século XVII, quase um século após a morte de Calvino, por pastores e teólogos Puritanos, reunidos com este fim pelo Parlamento Inglês, na Assembléia de Westminster. O alvo dos eruditos ali reunidos durante vários anos era um só: formular de forma sistemática a doutrina bíblica, partindo dos princípios de interpretação herdados da Reforma. A Igreja Presbiteriana tem adotado essa Confissão como a expressão correta do ensino das Escrituras. Os seus autores foram profundamente influenciados por João Calvino. Esta influência se percebe claramente no ensino da Confissão sobre o Espírito Santo, e em especial, na relação do Espírito com a Palavra.

Assim, no seu capítulo sobre as Escrituras, a Confissão declara, nos melhores termos calvinistas, que a autoridade da Escritura não depende do testemunho do homem ou da Igreja, mas de Deus ( I, 4), que a nossa certeza da sua infalível verdade e autoridade divina provém do testemunho do Espírito Santo em nossos corações (I, 5), que à Escritura nada se acrescentará em tempo algum, nem por novas revelações do Espírito, nem por tradições de homens (I, 6). A Confissão reafirma, com Calvino, que é necessária a íntima revelação do Espírito de Deus para a compreensão salvadora das coisas reveladas na Palavra (I, 6), e que, finalmente, o Juiz Supremo pelo qual todas as controvérsias religiosas têm de ser examinadas é o Espírito Santo falando nas Escrituras (I, 8).

Relevância do Ensino de Calvino para Nós Hoje



A Época em que Vivemos
A influência do movimento neopentecostal, surgido na década de sessenta, tem-se feito sentir de forma profunda nas denominações evangélicas históricas, e também dentro da Igreja Presbiteriana do Brasil. Não podemos tratar o movimento como um bloco monolítico — existem, dentro dele, diversas correntes e ramificações, o que faz com que generalizações tornem-se injustas. Mas, onde aparece com toda a liberdade, o neopentecostalismo manifesta a crença em novas revelações através de profecia e línguas, visões e sonhos, todos atribuídos ao Espírito Santo, e em alguns casos, práticas estranhas ao Cristianismo histórico, que são atribuídas ao poder do Espírito Santo, como "cair" no Espírito, o "sopro" do Espírito, o "riso santo", característica principal do movimento conhecido como "a bênção de Toronto". 

Há pastores que pretendem ter controle sobre o Espírito Santo, que presumem concedê-lo pela imposição de mãos, lançá-lo sobre o povo, girando o paletó, soprando sobre eles, etc., como o conhecido carismático Benny Hinn. Estes super-pastores determinam até mesmo quando o Espírito vai curar ou agir, pois marcam com antecedência reuniões de cura e libertação, coisa que nem mesmo o Senhor Jesus e os apóstolos fizeram.

A Igreja Presbiteriana está aturdida, tomada de surpresa, por estes ensinos. Muitas de suas igrejas locais têm adotado, em maior ou menor medida, as doutrinas e práticas do neopentecostalismo. Podemos receber ajuda do ensino de Calvino, nesta hora?

Em que o Ensino de Calvino nos Ajuda Hoje?
Em primeiro lugar, o ensino de Calvino sobre o testemunho interno do Espírito vem lembrar à Igreja que, nestes tempos difíceis, ela deve buscar de Deus a íntima iluminação do Espírito para compreender e aplicar as Escrituras à sua vida e missão. Corremos o risco de pensar que Calvino, em sua luta contra os excessos dos "Entusiastas", caiu no extremo do academicismo frio. Balke nos relata o que de fato ocorreu: "Calvino, o teólogo do Espírito Santo, queria guardar-se contra o fanatismo, sem porém impedir a liberdade do Espírito."(28) Como Calvino, devemos nos guardar dos excessos de hoje, ao mesmo tempo em que, submetendo-nos à liberdade do Espírito, procuramos a sua iluminação. Mas, para isto, é necessário arrependimento e saneamento da vida das igrejas locais, dos conselhos, concílios, organizações e instituições eclesiásticas que compõem a IPB. É preciso nos voltarmos a Deus em oração, suplicando a iluminação do Espírito, como bem orienta a Carta Pastoral da Igreja Presbiteriana do Brasil sobre o Espírito Santo:
Ao mesmo tempo em que orienta a Igreja a guardar-se de uma interpretação das Escrituras que parte dos princípios hermenêuticos equivocados da experiência neopentecostal, a Igreja também adverte contra uma interpretação intelectualizada e árida das Escrituras, que se esquece da necessidade da iluminação do Espírito para sua compreensão e de que Deus promete ensinar àqueles que procuram andar em santidade e retidão (Sl 119.18, 33-34; Lc 24.44-45).(29)
Em segundo lugar, Calvino nos desafia a examinar todas as manifestações espirituais pelo crivo da Palavra de Deus, quanto à natureza, ao propósito, e ao modo destas manifestações. Essa prática está pressupondo corretamente o ensino bíblico de que o Espírito Santo não se contradiz. As Escrituras foram inspiradas por ele. Embora o Espírito aja de formas distintas em épocas distintas, jamais o faz em contradição ao que nos revelou na Palavra. Deveríamos estar abertos para o fato de que o Espírito tem enfatizado aspectos diferentes da Palavra em épocas diferentes — porém, jamais indo além dela ou contra ela.

Em terceiro lugar, o ensino de Calvino nos alerta contra os que pretendem ter total controle sobre o Espírito, que pretendem dispensar o batismo do Espírito pela imposição de mãos, que "ensinam" aos crentes imaturos e incautos a falar em línguas. Alerta-nos a rejeitar todo ensino, movimento, culto, liturgia, onde a Palavra de Deus não receba a devida proeminência. Se o Espírito fala pela Palavra, a Palavra deve ser o centro.

Muitos presbiterianos consideram-se calvinistas e reformados, mas quantos realmente percebem as implicações do ensino calvinista reformado sobre a obra do Espírito para as práticas neopentecostais que são aceitas em muitas das nossas igrejas? Calvino foi, de fato, um homem do Espírito Santo, que guiado por Ele, tornou-se o principal instrumento de Deus para a Reforma do século XVI, movimento que, na realidade, foi um dos maiores reavivamentos espirituais ocorridos na Igreja Cristã, após o período apostólico. Todos nós queremos um reavivamento espiritual, da mesma magnitude. Calvino, que viveu e ministrou em meio àquela tremenda manifestação de poder divino, não teve receio de ofender o Espírito por inquirir, de forma profunda e meticulosa, sobre a genuinidade dos fenômenos que sempre acompanham os grandes movimentos espirituais da História. Se por um lado não devemos ter medo do que o Espírito possa fazer, por outro, devemos temer a obra espúria dos espíritos enganadores, e do nosso próprio coração enganoso.

E por fim, vale a pena mencionarmos que "a era do Espírito Santo", como é conhecida em muitos meios neopentecostais, iniciou-se, não em 1906, com a reunião na rua Azuza, nos Estados Unidos, mas desde o dia de Pentecoste. As evidências bíblicas são numerosas. Em seu sermão no dia de Pentecoste, o apóstolo Pedro declarou que a descida do Espírito estava inaugurando os últimos dias (At 2.16-21). Os demais apóstolos ensinaram, semelhantemente, que os últimos dias, a dispensação anterior ao dia do julgamento final, já havia chegado ( 1 Co 7:29; 1 Jo 2.18). Enfatizo esse ponto pois alguns poderiam argumentar que estamos vivendo hoje na "era do Espírito", e que Calvino viveu antes dessa época. Os que assim acreditam, afirmam que hoje o Espírito está agindo de uma forma muito mais intensa, e mesmo, diferente, da época da Reforma, e que, portanto, o que Calvino experimentou e ensinou está, num certo sentido, ultrapassado. Entretanto, as Escrituras nos ensinam que a Igreja já está vivendo os últimos dias, a dispensação do Espírito, desde o período apostólico. 

Calvino viveu e ensinou em plena época do Espírito, tanto quanto nós hoje vivemos e labutamos. O ensino de Calvino, por ser bíblico, pode nos servir de balizamento, indicando-nos o estreito caminho do equilíbrio, entre uma vida de piedade e uma mente firmada nas antigas doutrinas da graça.

NOTAS:
1 Jown Owen, The Holy Spirit: His Gifts and Power (Grand Rapids: Kruegel, 1960); Abraham Kuyper, The Work of the Holy Spirit (Grand Rapids: Eerdmans, 1946). Outros autores poderiam ser acrescentados, como o Puritano inglês Thomas Goodwin, e mais recentemente, Benjamim B. Warfield e George Smeaton.
2 Cf. João Calvino, As Institutas, ou Tratado da Religião Cristã , 4 vols., trad. Waldyr C. Luz (São Paulo: CEP e Luz para o Caminho, 1989). Calvino trata da divindade do Espírito em I.13.14-14, e da sua obra redentora (aplicando a salvação) no livro III, especialmente nos capítulos 1-2.
3 O termo "esquerda" tem sido empregado recentemente por alguns historiadores para se referir a esse grupo, sem qualquer conotação política.
4 Cf. a nota introdutória de B. Warfield em Kuyper, The Work of the Holy Spirit , xxvii.
5 Para uma lista das obras mais importantes sobre o Espírito Santo escritas após Calvino nos séculos XVII e XVIII, ver Kuyper, The Work of the Holy Spirit , lx-x.
6 Kuyper, The Work of the Holy Spirit , xxxiii-xxxiv.
7 Institutas , I.7.2; IV.2.1,9. Veja ainda Calvin's Commentaries , vol. 21, trad. W. Pringle (Grand Rapids: Baker, 1981) 242-44.
8 Institutas , I.7.1. Veja também os capítulos 7-9 do livro I, onde Calvino desenvolve o tema da autoridade das Escrituras.
9 Institutas , III.1.1; I.7.5.
10 Institutas , I.8.13; I.7.4. Cf. Ronald S. Wallace, Calvin's Doctrine of the Word and Sacrament (Grand Rapids: Eerdmans, 1957) 101-2.
11 Institutas , III.1.1; III.2.33-34; II.2.20; I.7.5. Veja ainda Calvin's Commentaries , vol. 20, 116-17, e vol. 22, 257.
12 Calvin's Commentaries , vol. 18, 101.
13 Devemos, com justiça, notar que Calvino deve muito dessa perspectiva ao ensino desbravador de M. Lutero, que já havia, antes dele, denunciado esse estado de coisas.
14 Veja acima nota .
15 William Balke, Calvin and the Anabaptist Radicals , trad. W. Heynem (Grand Rapids: Eerdmans, 1981) 2.
16 Para uma análise mais profunda do debate de Calvino com os Anabatistas consulte Balke, Calvin and the Anabaptist Radicals . Resumos sobre o movimento Anabatista durante a Reforma poderão ser encontrados nos livros clássicos em Português de História da Igreja, como Robert Nichols, W. Walker e Justo Gonzalez (vol. 6).
17 Esta obra se encontra publicada em Francês na coleção Corpus Reformatorum , ed. C.G. Bretschneider (Halle, 1834-1860), vol. 7, 145-248.
18 Institutas , I, 9, 1.
19 Institutas , I, 9, 2.
20 Para um estudo mais aprofundado, veja W. Kreck, "Wort und Geist bei Calvin", em Festchrift für Günther Dehn (Neukirchen, 1957) 168-173.
21 Institutas , I, 9, 1; cf. Wallace, Calvin's Doctrine of the Word and Sacrament , 130.
22 Institutas , I, 9, 2.
23 Institutas , I, 9, 2. Passagens como 1 Co 12.1-3, 14.29 e 1 Jo 4.1, entre outras, estabelecem critérios doutrinários pelos quais pode-se julgar as profecias e os profetas.
24 Institutas , I, 9, 2-3.
25 Ibid .
26 Calvin's Commentaires , vol. 22, 102-3.
27 Calvin's Commentaires , vol. 20, 174; veja ainda Wallace, Calvin's Doctrine of the Word and Sacrament , 89-90.
28 Balke, Calvin and the Anabaptist Radicals , 326.
29 " O Espírito Santo Hoje - Os Dons de Línguas e Profecia", em Cartas Pastorais (São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1995). O documento foi elaborado pela Comissão Permanente de Doutrina da IPB.
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